Primeiramente quero cumprimentar a todos por estarmos juntos nesta caminhada e por termos chegado até aqui. Hoje se finaliza mais um ciclo, e com ele concluímos uma experiência de renovação que trabalhamos juntos, que refletimos a cada semana em um passo diferente.
Admitimos nossos vícios e pecados. Compreendemos que a libertação de tais malefícios não seria imediata. Contudo, a vivência do Programa de Vida Nova dependia da nossa perseverança. Confiamos em Deus. Entregamos nossas vidas em Suas mãos. Arrependidos, confessamos os nossos pecados para renascer em espírito como criatura nova. Reparamos os males que causamos, professamos a nossa fé, oramos e vigiamos para não cair em tentação. Servimos gratuitamente para fazer dos excluídos os preferidos. Celebramos a eucaristia com os irmãos por uma vida plena, sem males e sem drogas. E esta semana estamos festejando cada dia de sobriedade que vivemos.
Cada um deve viver sua fé com autenticidade, festejando a vida com propósitos sóbrios, partindo-se do princípio de que cada momento que se vive é um presente que adquirimos e que devemos fazer o melhor com esse presente e esse presente é o aqui e agora. Então, vamos deixar passar como se fosse só mais um minuto? Que metas temos para a nossa vida? Que novos desafios vamos encontrar? O que ainda precisamos mudar para chegar onde queremos? O que realmente queremos da vida?
Junto com o final do nosso ciclo dos doze passos, estamos chegando ao fim de mais um ano, que certamente passou muito rápido para todos. Do que podemos nos lembrar de bom? A correria foi tamanha que não nos damos conta de muitas coisas que fizemos. Outras que achamos que fizemos e outras que ainda ficarão para o ano seguinte. Está chegando o tempo de Natal e para muitos isso quer dizer apenas que teremos muitas formaturas para ir, que teremos que comprar lembrancinhas pro pessoal do trabalho, que teremos que perder muito tempo nas lojas cheias para comprar os presentes de Natal para a família, que teremos que fazer uma faxina geral na casa, enfim, que teremos que festejar.
Mas festejar o que? Vamos assistir as cantatas de Natal, vamos ver os presépios espalhados pela cidade, vamos ficar maravilhados com as luzes e o verdadeiro sentido vai sendo colocado como pano de fundo. Vestimos a roupa que acabamos de comprar pra impressionar as outras pessoas. Fazemos ceias de dar inveja a qualquer faminto de países subdesenvolvidos. As empresas brindam seus lucros. E o verdadeiro sentido do Natal se esvai por que não nos preparamos para receber a pessoa de Cristo. Para nós, faz mais sentido ter uma árvore de Natal que um presépio dentro da nossa casa. E quando o fazemos, colocamos tudo já de uma vez para não dar trabalho, tudo para não dar trabalho.
Lembro-me da história de uma pessoa maravilhosa que me fez sentir vontade de vivenciar isso em minha casa. Ela me dizia que quando chegava o advento, sua mãe começava a montar o presépio, contando aos filhos toda noite um pouco da história do nascimento de Cristo. E primeiro montou estábulo e dizia que Jose e Maria estavam a caminho. Depois colocava alguns animais. E enquanto José e Maria já estavam mais próximos do estábulo, já trazia ao cenário os três reis magos que estavam mais distantes. Mais animais eram colocados pelas redondezas, enriquecendo o cenário. Apenas José, Maria e algumas vaquinhas dentro da gruta.
À medida que essa mãe ia lhe contando a história do nascimento de Jesus, ia também aumentando o desejo de vê-Lo, de apreciá-Lo, de recebê-Lo. Essa pessoa me falava o quanto se sentia parte daquele presépio, aguardando a chegada do Nosso Senhor. E só na noite de Natal, é que sua mãe trazia à cena o Menino Jesus. Colocava então uma estrela acima do estábulo, como se fora no céu, e aos poucos ia aproximando os animais, os três Reis Magos e ficavam todos admirando essa aproximação em volta deste Menino tão esperado. Essa história era construída aos poucos por todos da família, um pouquinho a cada noite, despertando o verdadeiro sentido do Natal.
Temos muito que festejar. Temos toda uma vivência compartilhada por gerações sobre as festas natalinas, onde trocamos presentes, desejamos coisas boas para as pessoas e esse período parece-nos passar ainda mais rápido, pois o comércio ferve e corremos contra o tempo para achar o que queremos dar de presente. Vivemos com intensidade o nosso lado consumista. Mas será que já paramos pra pensar sobre a chegada de Alguém muito especial que pode transformar a nossa vida? Já colocamos essa proposta para os nossos filhos? E os nossos filhos: Ah, alguém especial, que tem uma roupa vermelha, e que dá presentes…
E temos diante de nós dois grandes desafios neste período de Natal. O primeiro encontrar o sentido verdadeiro do Natal. Não o que nos leva a presentear, mas o que nos faz aproximar de uma manjedoura e reafirma as nossas esperanças, o sentido que nos faz acreditar que a Sua vinda trará paz e plenitude se nós ajudarmos a espalhar. O segundo grande desafio é mostrar esse sentido aos nossos filhos. É contar-lhes a história e fazê-los participar dessa história com alegria, pois está para nascer Aquele que transforma o nosso coração, que nos faz ser alguém melhor.
Já ouvi muita gente comentar que o Natal é uma festa triste. Provavelmente porque se põe uma expectativa, esperando que aconteça uma mudança radical, como um milagre. Mas o próprio nascimento de Cristo já é um milagre, infelizmente entendido por poucos. E não é apenas mais um nascimento. Ora, se nasce alguém em nossa família ficamos felizes. Imagine saber que esse Alguém vai mexer com a nossa estrutura, vai remover de nós a escuridão, vai trazer confiança, vai aliviar nossas dores, vai nos tornar mais próximos de Deus, vai nos renovar, vai unir e semear esperança.
E não há como viver essa alegria isoladamente. Às vezes, entendo porque dizem ser uma festa triste. É que muitas pessoas percebem que a troca de presentes é muito vazia, que o jantar glamoroso encheu apenas a barriga, mas o espírito precisa se alimentar de algo mais. Falta o elemento principal. Todos sabem que comemoramos o nascimento de Jesus Cristo. Só não compreendem na íntegra o verdadeiro significado disso tudo. Muitos esperam alegorias, farras, movimentos nas ruas, sons altos… Qualquer coisa que possa abafar o grito da angústia que carregam. Por isso o Natal é triste, porque faz renascer a verdade em nossa vida. Para uns de forma tão singela, para outros, dolorosamente monótono.
A alegria não deve se resumir na comida, na bebida, na farra, mas no motivo que nos fez reunir. E nesse momento chamo a atenção dos familiares que tem dentro de sua casa algum dependente. Nestes dias festivos, sempre acontece de propiciar alguma festividade que seja marcante. Então se realiza um almoço ou uma janta. O problema é que a comemoração só tem sentido se a geladeira estiver abarrotada de bebida, se o estoque estiver cheio. Há familiares que dizem: “Não, ele sabe que não deve beber! A responsabilidade é dele”. Muitas vezes a gente entende a partir dessa fala por que esse dependente não consegue se distanciar do seu vício.
Nessa fala está explícita a falta de consideração, de carinho, de afetividade, a falta de compromisso, de zelo, a falta de amor ao próximo. É lamentável dizer isto, mas na maioria das vezes precisamos começar o tratamento pelo familiar. Ele quer que o seu dependente se cure, se trate, mas não quer fazer o esforço que lhe cabe. E então muitos argumentam: “Mas já fizemos de tudo, já pagamos tratamento, já internamos numa clínica, já gastamos o que não podíamos.” Se o seu dinheiro não foi suficiente para livrar a sua família das drogas, que tal agora investir no amor que não se compra e nem se paga?
A bebida que está dentro de casa é o primeiro estopim para quem está em abstinência. Mesmo que a droga de abuso seja outra é a bebida quem vai fazer o papel acionador da atitude inconseqüente. Quando a pessoa consome álcool, ela se excede nas suas ações, sem pensar no depois, apenas na satisfação momentânea dos seus desejos de ir além, pois adquire mais coragem, menos medo, mais ousadia, menos preocupação, menos senso crítico e moral, desvalorizando a própria vida e a dos outros. A partir daí, essa pessoa está no ponto para ir atrás da sua droga de abuso.
Se quisermos os nossos dependentes saudáveis, sóbrios, devemos também agir dessa forma, dando o nosso exemplo. Nossas festas podem ser sadias, alegres e sem álcool. E aqui vai um desafio também para as nossas comunidades: podemos fazer a diferença nas festas populares, nas festas de padroeiros. Nossa comunidade cristã deve dar o exemplo. É preciso que haja a conversão pela sobriedade. Podemos fazer dessa proposta um diferencial e tenho certeza que a experiência será válida. A festa cristã deve ser limpa. E irmanados com todos na mesma esperança devemos lutar por uma vida sem drogas e sem males.
Malena Andrade – Psicóloga assessora da Pastoral da Sobriedade da Diocese de Blumenau