Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor
1ª Leitura: Is 50,4-7
Sl 21
2ª Leitura: Fl 2,6-11
Evangelhos: Mc 11, 1-10 (procissão) Mc 14,1-15,47 (paixão)
Seguir o Mestre e partilhar do destino do Mestre – a cruz
Neste domingo com a celebração da solenidade de Ramos entramos com toda a Igreja na “grande semana” ou “Semana Santa”. O Evangelho da Paixão que ouviremos em nossas liturgias marcam o desfecho desta solenidade que tem seu ponto alto na morte de Jesus: “Jesus, porém, tornando a dar um grande grito, expirou” (Mc 15,37).
É um domingo verde e vermelho, que transita entre a euforia dos aplausos e a crueldade da cruz. Domingo da contradição, dos extremos, dos ramos e da Paixão. Celebração que mostra a natureza pendular dos humores humanos, que revela as maravilhas e as misérias que podem nascer no coração da pessoa a partir das escolhas que realiza.
A liturgia deste último domingo da Quaresma convida-nos a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo e o pecado fossem vencidos. A cruz (que a liturgia deste domingo coloca no horizonte próximo de Jesus) apresenta-nos a lição suprema, o último passo desse caminho de vida nova que, em Jesus, Deus nos propõe: a doação da vida por amor.
Na bênção de Ramos ouvimos a entrada de Jesus em Jerusalém: Marcos 11,1-10:
A entrada de Jesus em Jerusalém, montado em um burrinho, faz memória do projeto de Deus, onde o maior é aquele que serve. A monarquia, onde o maior é o rei e a elite, é simbolizada pelo cavalo. Na monarquia existe uma sociedade de desiguais, onde a elite é servida pela maioria.
A paixão de Jesus de Marcos nos traz uma grande teia de relações: relações de julgamento, traição e condenação por um lado e apoio, fidelidade e amor de outro. Há confronto entre Jesus e sumos sacerdotes e letrados que procuravam um artifício, uma emboscada para matá-lo; por ser tempo de páscoa, tinham medo que o povo se amotinasse. Há outro confronto entre alguns comensais que acham um desperdício o tratamento oferecido a Jesus pela mulher que unge a cabeça de Jesus com perfume caríssimo. Jesus entra em confronto com quem reclama, ficando a favor da mulher, dizendo que será uma boa notícia/evangelho o que ela fez. Judas escolhe ficar contra Jesus e do lado dos que tinham dinheiro, os sumos sacerdotes. Jesus diz que os discípulos tropeçarão. Há confrontação entre Jesus e Pedro que se julga melhor que os demais. Jesus está numa tristeza mortal e os amigos dormem. Jesus ainda se confronta, ou se encontra com Pilatos, Barrabás, testemunhas falsas, torturadores, a multidão, os soldados, os crucificadores, os zombadores, centurião, Simão de Cirene, as mulheres: Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, Salomé e muitas outras, José de Arimatéia. Antes de sua prisão, Jesus fica sozinho e se relaciona com o Pai, em oração. Cada pessoa reage de acordo com sua opção de estar comprometido com Jesus ou contra a sua proposta que é opção pelo Reinado de Deus.
A palavra de Deus que nos vem por Isaías (1 leitura) é chamado de cântico do Servo. A missão do servo é o bem de todo o povo, por isso ele recebe do Senhor uma língua que conforte os abatidos; um ouvido de discípulo e proteção para enfrentar as provações.
Isaias ainda nos oferece outras interessantes informações acerca deste seu misterioso servo que tocam também seus sentidos: Deus o deu ‘língua adestrada’. Fico pensando no significado disto. E da sua atualidade. Nós desaprendemos há muito a ‘adestrar nossas palavras’, a purificar nossa língua. É mais confortável ‘adestrar a outrem’, corrigir os erros dos outros. O segundo aspecto ligado a sensibilidade do servo está ligado ao que ouve: “ele me desperta cada manhã e me excita o ouvido, para prestar atenção como um discípulo” (Is 50, 4). O servo escuta cada manhã a Palavra de Deus. E a boca fala o que está em seu coração: Como nós estamos purificando nossa sensibilidade para que ela se torne ponte espiritual para mim e meus irmãos?
Jesus crucificado gritou, rezou o salmo 22 que a tradição conservou em aramaico o primeiro versículo. Podemos supor que Jesus tenha rezado o salmo inteiro. Ele é o justo confiante que clama. Deus ouve seu clamor e de todos os injustiçados.
O hino a Jesus, Messias, Senhor e por ele ao Pai em filipenses, (2 leitura) nos fala que Jesus é o verdadeiro Servo sofredor que, sem medo, viveu a experiência da limitação e sofrimento humanos até a morte. Deus o recompensou, dando-lhe o nome de Senhor. É um hino da liturgia das primeiras comunidades que traça uma parábola de descida e subida da existência de Jesus em obediência ao Pai até o extremo da cruz. Ao tocar o fundo do poço, acontece a exaltação por ação soberana de Deus.
Examinemos se nosso projeto de vida eclesial e social coincide com o de Jesus/Servo, ou se preferimos um Jesus triunfalista, sem ser Servo, senhor comprometido com o poder e o sucesso.
Assim, nessa Semana Santa somos convidados a contemplar a cruz, onde se manifesta o amor e a entrega de Jesus, que significa assumir a mesma atitude e solidarizar-se com aqueles que são crucificados neste mundo: os que sofrem violência, os que são explorados, os que são excluídos, os que são privados de direitos e de dignidade… Significa olhar a cruz de Jesus e denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo, em termos de estruturas, valores, práticas, ideologias; significa evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; significa aprender com Jesus a entregar a vida por amor… Viver deste jeito pode conduzir à morte, pois seguir o mestre significa partilhar do destino do Mestre – a cruz; mas o cristão sabe que amar como Jesus é viver a partir de uma dinâmica que a morte não pode vencer: o amor gera vida nova e introduz na nossa carne os dinamismos da ressurreição. A Semana Santa tem somente este endereço. Seu desfecho será a cruz e nossa salvação!
Pe Osmar Debatin
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