Neste período do Advento – o tempo que nos prepara para o Natal – é-nos proposta, de novo, a figura de S. João Batista. Ele foi enviado por Deus a fim de preparar o caminho para a vinda do Messias. A todos os que iam ter com ele, pedia uma profunda mudança de vida: «Produzi frutos de sincero arrependimento» (Lc 3,8). E a quem lhe perguntava: «Que devemos, então, fazer?» (Lc 3,10), respondia:
«Quem tem duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma, e quem tem mantimentos faça o mesmo».
Porquê dar ao outro aquilo que é meu? Porque o outro, tendo sido criado por Deus, tal como eu, é meu irmão, minha irmã. Portanto, é parte de mim. «Não posso ferir-te sem me magoar» (2), dizia Gandhi. Fomos criados para sermos uma dádiva uns para os outros, à imagem de Deus que é Amor. No nosso sangue temos inscrita a lei divina do amor. Jesus, vindo viver entre nós, revelou-no-lo claramente quando nos deu o seu mandamento novo: «Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei» (cf. Jo 13,34). É a “lei do Céu”, a vida da Santíssima Trindade trazida à Terra, é o centro do Evangelho. Tal como no Céu o Pai, o Filho e o Espírito Santo vivem em plena comunhão, a ponto de serem uma coisa só (cf. Jo 17,11), também nós, na Terra, seremos nós próprios na medida em que vivermos na reciprocidade do amor. E como o Filho disse ao Pai: «Tudo o que é meu é teu e o que é teu é meu» (Jo 17,10), também entre nós o amor é completo quando se partilham não só os bens espirituais, mas também os bens materiais.
As necessidades de um nosso próximo são as necessidades de todos. Falta a alguém o trabalho? É a mim que falta. Há quem tem a mãe doente? Ajudo-o como se fosse a minha. Outros têm fome? É como se eu tivesse fome e procuro comida para eles como o faria para mim próprio.
É a experiência dos primeiros cristãos de Jerusalém: «(A multidão) tinha um só coração e uma só alma. Ninguém chamava seu ao que lhe pertencia, mas entre eles tudo era comum» (At 4,32). Comunhão de bens que, embora não obrigatória, era vivida, no entanto, intensamente entre eles. Não se tratava – como explicaria o apóstolo Paulo – de fazer entrar em apuros alguns para aliviar outros, «mas sim de que haja igualdade» (2Cor 8,13).
S. Basílio de Cesareia diz: «Ao faminto pertence o pão que tu pões de lado; ao nu, o casaco que guardas no teu baú; aos indigentes, o dinheiro que tens escondido» (3).
E Santo Agostinho: «O supérfluo dos ricos pertence aos pobres» (4).
«Também os pobres se têm de ajudar uns aos outros: um pode emprestar as suas pernas ao coxo; o outro, os seus olhos ao cego, para o guiar; um outro ainda, pode visitar os doentes» (5).
«Quem tem duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma, e quem tem mantimentos faça o mesmo».
Também hoje podemos viver como os primeiros cristãos. O Evangelho não é uma utopia. São uma demonstração disso, por exemplo, os novos Movimentos eclesiais que o Espírito Santo suscitou na Igreja, para fazer reviver, com frescura, a radicalidade evangélica dos primeiros cristãos e para responder aos grandes desafios da sociedade atual, onde as injustiças e a pobreza são tão fortes.
Recordo o início do Movimento dos Focolares, quando o novo carisma nos infundia no coração um amor muito especial pelos pobres. Quando os encontrávamos na rua, tomávamos nota das suas moradas, para mais tarde os ir visitar e ajudar. Eram Jesus: «Foi a mim que o fizestes» (Mt 25,40). Depois de os termos visitado nos seus casebres, convidávamo-los para irem almoçar à nossa casa. Para eles, púnhamos a toalha mais bonita, os melhores talheres, a comida de melhor qualidade. À nossa mesa, no primeiro focolar, sentavam-se uma focolarina, um pobre, uma focolarina, um pobre…
A um dado momento, pareceu-nos que o Senhor nos pedia que também nós nos tornássemos pobres, para servirmos os pobres e a todos. Então, num quarto do primeiro focolar, cada uma colocou, ali no meio, aquilo que pensava ter a mais: um casaco, um par de luvas, um chapéu, e até um casaco de cabedal… E, atualmente, para ajudarmos os pobres, temos empresas que dão postos de trabalho e dão os seus lucros para distribuir!
Mas ainda há muito a fazer pelos “pobres”.
«Quem tem duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma, e quem tem mantimentos faça o mesmo».
Temos tantas riquezas para pôr em comum, mesmo que não nos pareça! Temos sensibilidades a aperfeiçoar, conhecimentos a adquirir para podermos ajudar concretamente, para encontrar o modo de viver a fraternidade. Temos afeto no coração para dar, cordialidade para exprimir, alegria para transmitir. Temos tempo para pôr à disposição, orações, riquezas interiores para pôr em comum pessoalmente ou por escrito. Mas temos também, às vezes, coisas: carteiras, canetas, livros, dinheiro, casas, automóveis para pôr à disposição… Provavelmente acumulamos muitas coisas, pensando que um dia nos vão ser úteis e, no entanto, ali ao lado, há quem precise delas urgentemente.
Assim como as plantas absorvem do solo apenas a água que lhes é necessária, também nós procuremos ter apenas aquilo de que precisamos. É preferível que, de vez em quando, verifiquemos que nos falta qualquer coisa. É melhor sermos um pouco pobres do que um pouco ricos.
«Se todos se contentassem com o necessário – dizia S. Basílio –, e dessem o supérfluo aos necessitados, já não haveria nem ricos nem pobres» (6).
Experimentemos, comecemos a viver assim. É claro que Jesus não deixará de nos fazer chegar o cêntuplo. Teremos então a possibilidade de continuar a dar. No final, ele vai dizer-nos que tudo o que tivermos dado, seja a quem for, foi a Ele que o demos.
Chiara Lubich
1) Publicada em Città Nuova 2003/22, p. 7; 2) cf. Wilhelm Mühs, Parole del cuore, Milão 1996, p. 82; 3) Aforismi e citazioni cristiane, Piemme, 1994, p. 44; 4) ID, p. 45; 5) ibid.; 6) Aforismi e citazioni cristiane, p. 44.