“Um humilde trabalhador da vinha do Senhor”
Por Carmen Elena Villa
"Depois do grande Papa João Paulo II, os senhores cardeais me elegeram. Um simples e humilde trabalhador da vinha do Senhor": estas foram as primeiras palavras do então recém-eleito pontífice Bento XVI, quando, às 18h de Roma, a Capela Sistina deixou ver a fumaça branca, para que o cardeal chileno Jorge Arturo Medina Estevez pronunciasse as duas palavras mais esperadas nesse então pela opinião pública: "Habemus papam".
Era o terceiro conclave do qual participava Joseph Ratzinger, que foi elevado a cardeal por Paulo VI, em 1977. Durante 24 anos, serviu a Igreja como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.
Este grande humanista tem o recorde, entre todos os pontífices, de quem mais livros escreveu antes de subir ao trono de Pedro: são 142 obras publicadas que apresentam sua rica teologia e espiritualidade, caracterizada por explicar, em uma linguagem muito simples, os grandes mistérios da fé que podem ser entendidos em um interessante diálogo com a luz natural da razão.
Com características profundamente humanas, Bento XVI gosta de gatos, toca piano e seu compositor favorito é Mozart. Seus pais se chamavam José e Maria. É irmão do também sacerdote George Ratzinger; juntos, eles receberam o sacramento da Ordem, em 1951.
Seus ensinamentos
Depois de ter terminado o tema dos salmos, que o Papa João Paulo II havia iniciado nas catequeses das quartas-feiras, Bento XVI começou a falar sobre um tema que para ele sempre foi fundamental: a tradição do cristianismo e o pensamento dos primeiros séculos. Por isso, dedicou várias das audiências a falar de cada um dos apóstolos, de acordo com as Sagradas Escrituras e a Tradição. Depois, quis aprofundar nos padres da Igreja, mostrando quão atual é seu pensamento.
Bento XVI instituiu dois anos temáticos para ressaltar personagens e aspectos particulares do cristianismo: o primeiro foi o Ano Paulino, para comemorar os dois mil anos do nascimento de São Paulo. Sua inauguração e encerramento aconteceram na Basílica de São Paulo Fora dos Muros, onde, segundo a Tradição, jazem os restos do Apóstolo dos Gentios. Também dedicou várias de suas catequeses a este importante apóstolo, que se converteu ao cristianismo depois de ter perseguido a Igreja.
Igualmente, o Pontífice quis dedicar um ano aos sacerdotes, o qual será encerrado no próximo mês de junho. Dessa maneira, quis comemorar os 150 anos de falecimento de São João Maria Vianney, o Santo Cura de Ars, padroeiro dos párocos.
Em seu pontificado, escreveu o livro "Jesus de Nazaré", em qualidade de teólogo, não de Papa. Em sua obra, ele mostra a pessoa de Jesus Cristo como Filho de Deus, totalmente obediente ao Pai, sem perder uma só característica da sua humanidade. Espera-se, para o final deste ano, a publicação da segunda parte desta importante obra cristológica.
Três encíclicas evidenciaram seu incrível talento intelectual ao serviço da fé. A primeira foi Deus caritas est (fevereiro de 2006), dividida em duas partes: no início, recorda alguns pontos essenciais sobre o amor de Deus; depois, busca concretizar esse amor na entrega ao próximo.
Depois veio a encíclica Spe salvi (novembro de 2007), na qual assegura que, graças à esperança, o homem pode enfrentar o presente, por mais difícil que possa ser. Exortas as pessoas a terem sempre sua meta no que é eterno.
E na Caritas in veritate (julho de 2009), fala sobre a caridade baseada sempre na verdade, como caminho para o verdadeiro desenvolvimento. Bento XVI quis, nesta carta, prestar uma homenagem ao seu predecessor, Paulo VI, e à encíclica Populorum Progressio, publicada em 1967.
Beatificações e canonizações
Nestes 5 anos de pontificado, Bento XVI proclamou 516 beatos; as beatificações começaram a ser celebradas na diocese dos beatos e presididas por um arcebispo, em representação do Papa (em geral, Dom Angelo Amato, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos).
O Papa também canonizou 28 novos santos, entre eles o sacerdote belga Damião de Veuster (1840-1889), o "apóstolo dos leprosos". Em outubro deste ano, canonizará também a primeira australiana, Madre Mary Mackillop (1842 – 1909), cofundadora das Religiosas de São José.
Fatos sem precedentes
Algumas publicações e pronunciamentos de Bento XVI fizeram história, entre eles a Anglicanorum coetibus (publicada em novembro de 2009), que institui ordinariados pessoais para permitir a outro credo que entre em comunhão com a Igreja Católica.
Durante estes cinco anos, ele visitou três sinagogas (em Colônia, Nova York e Roma), três mesquitas (em Istambul, Aman e Jerusalém) e teve um encontro com a comunidade islâmica de Roma, ao concluir o fórum católico-muçulmano de novembro de 2008.
Outra publicação sem precedentes foi a carta pastoral aos católicos da Irlanda, devido aos casos de abuso sexual a menores por parte do clero; tal documento foi resultado de uma reunião do Papa com os bispos irlandeses para examinar os casos, suas causas e medidas para que estes fatos não se repitam.
Peregrino
Dentre suas viagens fora da Itália, a primeira foi à Alemanha, onde presidiu a Jornada Mundial da Juventude de Colônia.
Também visitou a Polônia (maio de 2006), onde orou no campo de concentração de Auschwitz. Em julho do mesmo ano, participou, em Valência, do Encontro Mundial das Famílias e, em setembro, voltou à Alemanha e visitou Munique, Altötting e Ratisbona. Em dezembro, este na Turquia, onde se encontrou com o patriarca ortodoxo de Constantinopla, Bartolomeu I.
Sua primeira viagem à América Latina foi ao Brasil (maio de 2007), onde inaugurou a 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, em Aparecida. Em setembro, viajou à Áustria, para celebrar os 850 anos da fundação do Santuário de Mariazell.
Esteve nos Estados Unidos em abril de 2008, para celebrar os 200 anos de arquidiocese metropolitana de Baltimore, fato que trouxe o nascimento de outras quatro dioceses: Nova York, Filadélfia, Boston e Louisville. Lá também se encontrou com judeus e com outras denominações cristãs do país.
Em Sydney (Austrália), em julho de 2008, celebrou a Jornada Mundial da Juventude, refletindo sobre receber a força do Espírito Santo para ser testemunhas de Cristo. Em setembro do mesmo ano, esteve na França, para comemorar os 150 anos das aparições de Nossa Senhora de Lourdes.
Em março de 2009, viajou à África, onde entregou o Insturmentum laboris do sínodo sobre a Igreja neste continente. Em maio, esteve na Terra Santa, alentando a Igreja do país. Em setembro, viajou à República Tcheca, onde visitou a imagem do Menino Jesus de Praga e recordou a figura de São Venceslau.
Sua última viagem fora da Itália foi à pequena República de Malta, para celebrar os 1950 anos dos naufrágios de São Paulo.
Nestes cinco anos, Bento XVI soube imprimir na Igreja suas melhores qualidades como pessoa: inteligência, sensibilidade, solidariedade, humanismo, firmeza e disciplina.
"Consola-me o fato de que o Senhor sabe trabalhar e agir inclusive com instrumentos insuficientes; e me confio às vossas orações", disse.
"Na alegria do Senhor ressuscitado, confiando em sua ajuda contínua, continuemos adiante. O Senhor nos ajudará e Maria, sua Santíssima Mãe, estará ao nosso lado", afirmou.
ZENIT, 19/04/2010