Por Dom Jesús Sanz Montes, ofm, arcebispo eleito de Oviedo
Publicamos o comentário ao Evangelho deste domingo, 4º do Tempo Comum (Lucas 4,21-30), redigido por Dom Jesús Sanz Montes, ofm, bispo de Huesca e de Jaca, arcebispo eleito de Oviedo (Espanha), sede da qual tomará posse neste sábado.
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A cena do Evangelho deste domingo nos situa com Jesus na sinagoga de Nazaré. Jesus passou por lá pouco tempo depois da visita anterior e, em seu fugaz regresso, descobriu a indiferença repleta de preconceito dos seus conterrâneos com relação à sua Pessoa. Em pé, Jesus dirá aquela frase que se tornou célebre: ninguém é profeta em sua terra.
Qual era a dificuldade dos nazarenos com relação a Jesus? Precisamente uma familiaridade que os impedia de reconhecer n’Ele alguém maior que o filho do carpinteiro, o da Sra. Maria. Eles acreditavam conhecer a quem, no fundo, desconheciam profundamente. Em espanhol, temos esse ditado belíssimo: “Del roce nace la querencia”. Mas já vimos que nem tudo é assim sempre: podemos amar aqueles a quem não podemos tocar pela distância e ignorar calamitosamente a quem vemos e com quem tratamos todo dia. Então vem à memória a pergunta decisiva de Jesus aos seus discípulos: O que as pessoas dizem de mim? E vocês, quem dizem que eu sou? Esta é uma pergunta que poderia ser feita a nós, hoje.
Os nazarenos conheciam Jesus como se conhece um conterrâneo, alguém do bairro. Nós podemos conhecê-lo a partir do verniz das pinturas, do escorço de algumas imagens ou da literatura que nos fala d’Ele. Para muitos, este seria o bairro ou a paisagem em seu conhecimento de Jesus. Podemos dizer que há um halo cultural que nos permite saber d’Ele algumas coisas comuns, talvez algumas coisas a mais que as que seus conterrâneos conheciam. Eles recordavam de Jesus o que haviam visto em sua juventude, enquanto cresciam no povoado. Nós podemos recordar o que aprendemos rapidamente. Mas só conhece Jesus quem se fiou da sua palavra e quem foi seduzido pela sua presença.
Hoje é um dia para desejar conhecer o Senhor por dentro, a partir do coração que ora e que ama, a partir do testemunho que narra, com atos simples e cotidianos, o amor que o invade e o torna pleno. Somente assim podemos dizer que Jesus não é um estranho profeta na terra da nossa vida, mas um Deus vizinho, cuja casa tem entranha e tem lar; uma casa habitada, que abre e escancara as portas. Com Ele convivemos; a Ele vamos contar nossas tristezas, buscando o consolo nos desgostos, quando a vida parece que tenta nos acurralar; a Ele vamos também para agradecer pelos dons, pelas muitas alegrias com as que também esta vida sorri para nós. E descobrimos que esse Bom Deus, o melhor vizinho, sabe rir e sabe chorar, porque se importa com a nossa vida, com o nosso destino e com a nossa paz.
Deus, sem ser qualquer um, quer ser entre nós como um a mais, que não somente é o Caminho, mas também o caminhante junto a cada um.
ZENIT, 29 de janeiro de 2010