A expressão acima parece estranha? Saiba que ainda muito se ouvirá sobre ela, pois se trata de um evento que vem tomando proporções cada vez maiores no mundo, envolvendo empresários, trabalhadores, gestores, consumidores, fornecedores, cidadãos, estudiosos e demais operadores econômicos.
Tal afirmação tive após participar em Blumenau, sábado passado, do I Seminário Ecumênico para Empresários. Lá estavam padres, pastores, professores, estudantes, empresários e trabalhadores.
Para um economista como eu, estudioso de matérias econômicas e da gestão empresarial, fui tomado de surpresa com o fato de existir um movimento no mundo, que se propõe a dar um suplemento de humanidade à economia de mercado, sem renunciar aos valores e conquistas que o mercado obteve, com um refundamento antropológico e moralizador.
Este projeto foi proposto pela italiana Chiara Lubich, em maio de 1991, em visita a cidade de São Paulo, a fim de apresentar uma sociedade na qual “não havia nenhum necessitado entre eles”, semelhante a primitiva comunidade cristã, que podemos definir como a Espiritualidade da Unidade. Nasce justamente no Brasil, coincidentemente “num país onde se sofre de maneira dramática com o contraste entre poucas pessoas riquíssimas e milhões de pessoas paupérrimas”, segundo a mesma. Algo assim obteve acolhida imediata com forte repercussão, não apenas na América Latina, onde foi lançado, mas também em outros continentes. Até hoje, aderiram 754 empresas de diversos portes, sendo: 463 na Europa, 254 nas Américas, 27 na Ásia, 8 na África e 2 na Oceania.
Um dos maiores estudiosos do tema EdC, o italiano Luigino Bruno, em artigo publicado na revista Città Nuova no. 4 – 2010, diz: “Bento XVI reiterou recentemente que se deve fazer todo o possível para proteger e provocar o crescimento de postos de trabalho.
Também e especialmente hoje, o centro do sistema econômico deve ser ocupado pelas pessoas. Os capitais tecnológico, financeiro e social são, sem dúvida, importantes, mas o “capital humano”, ou seja, os trabalhadores, continua a ser a chave para uma economia que quer ser feita a medida da pessoa.
Em vez disso, a crise econômica e financeira global mostra com grande força que o trabalho humano definitivamente é relegado para o plano de fundo do nosso modelo de desenvolvimento capitalista, que, cada vez mais nas mãos das finanças perdeu contato com a fadiga do trabalho.
Por outro lado, esse é orientado para o consumo, dando vida a um dos fenômenos mais preocupantes dos nossos tempos: justamente a corrida ao consumo. Mas a história nos ensina que os povos se desenvolvem quando a tendência “competitiva” e agressiva dos seres humanos não se exprime principalmente no consumo (possuindo carros mais caros do que os de outras pessoas), mas no trabalho e na produção.
Além disso, esta crise teria devido nos ensinar que a riqueza que produz verdadeira prosperidade é apenas a que nasce do trabalho humano. As promessas de riqueza sem trabalho são sempre suspeitas e muito frequentemente ‘bluffs’ individuais e sociais”. O grande desafio passa a ser o surgimento de um novo modelo de pessoa, que tanto pode “ter”, mas deve estar centrada no “ser” e acima de tudo, estimulada a “servir”.
Para tanto, é fundamental um novo modelo de empreendedor ou empresário, que decide colocar em comunhão os lucros da empresa segundo três finalidades: ajudar as pessoas que estão em dificuldade, criando novos postos de trabalho; desenvolver estruturas de formação para pessoas imbuídas do amor e capazes de praticar uma economia que seja de comunhão e reciprocidade e, por fim, uma outra parte é utilizada para o desenvolvimento da própria empresa, que deve permanecer eficiente e competitiva, enquanto se abre a gratuidade. Segundo Lubich: “nessas empresas deixa-se espaço para intervenção de Deus, também na atuação econômica concreta.
E experimenta-se que, depois de cada opção que vai contra a corrente, que a práxis usual dos negócios desaconselharia, ele não deixa faltar aquele acréscimo que Cristo prometeu: uma arrecadação inesperada, uma oportunidade imprevista, a oferta de uma nova colaboração, a ideia de um novo produto de sucesso…”.
Estamos diante de uma nova leitura das relações sociais através da “comunhão”, que poderia prevalecer sobre a postura individualista que hoje prevalece na ciência econômica.
(Publicado no Jornal Correio do Povo, Porto Alegre, dia 25.03.2010)
Artigo enviado pela Pastora Sinodal Mariane Beyer Ehrat, com a obsevação abaixo:
Padre Raul,
veja anexo, que belo artigo de um economista que esteve lá no Seminário (Blumenau, 20 de março de 2010). Ele é sócio de um consultor luterano que havíamos convidado para olhar com olhos "acadêmicos" a proposta da EdC.
Grata.
PA. Mariane