Os dedos tateiam o teclado em busca das palavras. Na mente um aglomerado de pensamentos, no coração, um outro de sentimentos. Prestes a sair da garganta, um discurso quase pronto, que vai da gratidão ao medo, da esperança à saudade. Se fosse possível resumir numa palavra meu estado, não há dúvidas: feliz.
As pequenas experiências que fiz nestes primeiros dias me fazem pensar – levando em conta as devidas distâncias históricas – nos primeiros padres que chegaram a estas terras e percorreram, a cavalo, por certo, as picadas de antanho, indo ao encontro dos fiéis que os aguardavam com devoção. Percorri, desde que cheguei, alguns caminhos que, de estranhos, agora já se tornaram familiares, na intenção de descobrir onde estão as igrejas em que, brevemente, irei celebrar, o povo que irei encontrar, as estradas nas quais gastarei a sola do sapato – melhor, os pneus do carro, lembrando o espaço histórico-temporal acima referido.
São distancias grandes, recompensadas pela natureza de beleza única que desenha, um após outra, belas paisagens que, por si só, levam à contemplação de Deus. Enquanto sigo, estrada afora, na expectativa por descobrir se não será logo ali a próxima igreja, penso no legado deixado por aqueles que chegaram antes de mim e anunciaram a Palavra que, já encarnada, agora precisa de minha ajuda para continuar produzindo frutos, conforme o sopro do Espírito.
Penso nas mãos calejados dos antigos e nos seus rostos quase desfigurados pelo cansaço, que construíram a História que vejo ao longo do caminho e que ouço aonde paro. Penso nas festas, nas procissões, nas novenas, nos terços, nas sextas feiras santas, quase possíveis de serem vistas e tocadas nas lembranças e memórias que o povo ainda guarda com fé.
Não se pode jamais perder essa riqueza dos antepassados, o reconhecimento por todo esforço empreendido em tempos bem mais agrestes que os nossos, mas, não esqueçamos, a vida caminha para a frente. Em pleno século XXI, em meio à revolução digital, acomodados a tantas facilidades que nos são oferecidas e , ainda mais, no o alvoroço de uma pandemia sem precedentes, Deus planta nestas terras e deseja que aqui, igualmente a todos os sacerdotes que me precederam, eu viva plenamente todos o meu ministério, porque é ele que anseia por continuar vivo em cada lar, em cada lágrima, em cada sorriso, em cada nascimento, em cada gota de suor e sangue derramados, em cada vida sagrada que pisa este solo abençoado, em cada Eucaristia.
Meu lar agora é aqui, meu gentilício agora é riocedrense, minha língua materna ganha agora uma irmã italiana, meu povo agora é este, minha santidade agora a buscarei em meio a essa gente.
“Obrigado, Deus, pelas surpresas que reservas para os teus, obrigado pelos espinhos que ferem, obrigado pelas graças que experimentamos, obrigado pelo amor dispensado às tuas frágeis ovelhas, das quais faço parte. Obrigado porque diante daquilo que me é possível fazer, não obstante esta pandemia, teu cuidado tem se mostrado tão presente. Teus filhos estão com saudades da Eucaristia e eu, sem conhecê-los ainda, estou com saudades de celebrá-la com eles.
Pe. Fernando Steffens