Texto: Padre Raul Kestring
Políticas Públicas é o foco da Campanha da Fraternidade 2019 (CF 2019), cujo início se dará no próximo dia 6 de março. Para entendermos um pouco mais essa Campanha, precisamos entender um pouco mais o que são realmente Políticas Públicas. Pois disso dependerá um empenho efetivo nesse sentido. E nada melhor do que recorrermos ao esclarecimento do texto-base da mesma CF 2019: “São ações e programas que são desenvolvidos pelo Estado para garantir e pôr em prática direitos que são previstos na Constituição Federal e outras leis”. (Disponível em: https://www.todapolitica.com/politicaspublicas. Acesso em 15 de maio de 2018).
Pode, assim, parecer que Políticas Públicas não tenha nada a ver com a Igreja, os cristãos, os católicos. Não é bem isso. Vejamos. A Constituição Federal de 1988 possibilitou a participação direta da sociedade e, portanto também dos segmentos religiosos, na elaboração e implementação de Políticas Públicas através dos conselhos deliberativos, que foram propostos por leis complementares em quatro áreas:
1. Criança e Adolescente;
2. Saúde;
3. Assistência Social;
4. Educação.
O número 18 do Texto-Base explica: “Compreender melhor o papel e o sentido das Políticas Públicas, despertar a consciência e incentivar a participação de todo cidadão na construção dessas ações em âmbito nacional, estadual e municipal constitui um dos objetivos específicos desta Campanha, bem como propor políticas que assegurem os direitos sociais aos mais frágeis e vulneráveis, trabalhando para que as Políticas Públicas eficazes de governo se consolidem como políticas de Estado.“
Diante dessa proposta, a Igreja Católica, por meio do clero e dos leigos, está duplamente convocada a integrar-se nessa luta. Primeiro, porque é convocada pelo Estado à participação e à resolução dos problemas sociais e em todo o processo de formulação das Políticas Públicas. Em segundo lugar, não menos importante é a convocação do próprio Cristo quando ele se identifica com os sofredores em busca de alívio, superação, libertação.
Assim, sob pretexto algum, os católicos podem eximir-se de envolverem-se ou mesmo liderarem este processo de construção comunitária.
Mas o que tem a ver Políticas Públicas com a Quaresma?
Ainda referindo-me ao Texto-Base, Dom Leonardo Urlich Steiner, Bispo Auxiliar de Brasília e Secretário Geral da CNBB associa três elementos básicos do Evangelho, referindo- se à Quaresma, e à temática da CF 2019. Ele fala do Jejum, da Esmola e da Oração. Em resumo, ele diz que o jejum é “esvaziamento, expropriação, concentração, libertação! (…) Despertar em nós a fome de Deus e a disponibilidade de saciar a fome dos irmãos e irmãs” (Introdução do Texto-Base). “A Esmola – diz Dom Steiner – é partilha, misericórdia, cuidado, entrega!” (Idem). E a oração – continua o bispo auxiliar -, como necessidade do coração de transformar em palavras as manifestações amorosas de Deus” (Idem). Conclui Dom Leonardo: “(…) A Quaresma desperta a necessidade da partilha e nos aproxima da irmandade” (Idem).
O Direito e a justiça
“Serás libertado pelo Direito e pela justiça” (Is 1,27) – É esta o lema da CF 2019. Direito e justiça parecem termos diferentes para dizerem a mesma coisa. As pesquisas bíblicas mostram a verdadeira distância entre eles.
Biblicamente, a palavra direito designa a ordem justa da sociedade em sentido objetivo. Ordem esta que nem sempre é respeitada na vida real, embora não faltem leis sábias e justas. Por isso, à palavra direito a Bíblia faz seguir a palavra justiça. Pois esta é o fundamento do direito em sentido objetivo, motivação interior que impulsiona a viver a fundo o primeiro. “Assim, a justiça é razão pela qual nos preocupamos com os mais pobres dentre o povo, representados pela tríade: a viúva, o órfão e o estrangeiro para que haja direito na sociedade” (Cf. Texto Base, nº 110).
Essa tríade representa os pobres na Bíblia, segundo atualizadas pesquisas bíblicas. Esses pobres reivindicam do poder, das lideranças, direitos essenciais, como trabalho, justiça, terra, liberdade e trabalho. Nas diferentes épocas e sociedades bíblicas, são compreendidos como grupo sociológico, com papéis bem definidos. Portanto, a Campanha da Fraternidade não se contenta com “vernizes”, aparências, de direito. Vai mais a fundo: deseja moções interiores, verdadeira conversão à justiça.
Jesus declara: Assim, toda a árvore boa produz bons frutos, e toda a árvore má produz frutos maus (Mt 7,17). Perguntemo-nos, então: “Que tipo de árvore é a nossa sociedade de hoje?” A sociedade, porém, são as pessoas, lideranças e povo! Dessa forma, quanta luta, quanta conversão, quanta coragem, quanta coisa, necessitamos para que vejamos trinfarem o direito e a justiça! Desistir? Não! Seria trair a missão cristã, católica! Ser sal, fermento, luz, isso sim! Ser árvore boa! “A Deus nada é impossível” (Lc 1,37).