O Nosso Redemtor, prevendo que os discípulos ficassem perturbados com a sua Paixão, anuncia-lhes com muita antecedência os sofrimentos da sua Paixão e a glória da sua Ressurreição (Luc 18,31-33). Assim, vendo-o morrer como lhes anunciara, não duvidariam da sua Ressurreição. Mas, presos ainda à nossa condição carnal, os discípulos não podiam compreender estas palavras anunciando o mistério (v. 34). É então que intervém um milagre: debaixo dos seus olhos, um cego recupera a visão, para que aqueles que eram incapazes de assimilar as palavras do mistério sobrenatural fossem sustentados na sua fé à vista de um ato sobrenatural.
É que devemos ter um duplo olhar sobre os milagres do nosso Salvador e Mestre: são fatos que devemos aceitar como tais e são signos que remetem para outra coisa… Assim, no plano da história, não sabemos nada acerca de quem era este cego. Mas que ele é designado de forma obscura, sabemo-lo. Este cego é o género humano expulso, na pessoa do seu primeiro pai, da alegria do Paraíso, que não tem qualquer conhecimento da luz divina e está condenado a viver nas trevas. Contudo, a presença do seu Redemptor ilumina-o: ele começa a ver as alegrias da luz interior, e, desejando-as, pode pôr os pés na caminhada de vida das boas obras.
S. Gregório o Grande (c. 540-640), Papa, Doutor da Igreja
Sermões sobre o Evangelho, nº 2; PL 76, 1081 ( Trad. Luc comentada, DDB 1987, p139 rev.)