Meditação do Pe. Pedro García, missionário claretiano, conhecido evangelizador da América Central, sobre o evangelho deste domingo (Mc 7,1-23), 22º do Tempo Comum.
O evangelho que Marcos nos apresenta neste domingo é interessante e nos ensina uma lição, aparentemente muito elementar, mas que tem uma grande repercussão na vida do homem, especialmente do cristão.
Tudo começa por culpa dos próprios escribas e fariseus, mestres de Israel, cujas práticas religiosas – rigorosas, infantis e até ridículas muitas vezes, inventadas por eles mesmos ou recebidas dos seus antepassados – chocavam com a liberdade saudável, equânime e séria que Jesus praticava com seus discípulos.
Jesus se atém à Lei, enquanto os escribas e fariseus a desvirtuam com seus acréscimos tão divertidos… Assim, começam perguntando para Jesus: “Por que os teus discípulos – não se atrevem a dizer-lhe: ‘começando por ti’ – não seguem a tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos?” (Mc 7, 5).
A resposta de Jesus poderia aparecer imediatamente depois, mas Marcos – que escreve em Roma, para os romanos que não conhecem os costumes de Israel – acrescenta um inciso muito interessante: “Com efeito, os fariseus e todos os judeus só comem depois de lavar bem as mãos, seguindo a tradição recebida dos antigos. Ao voltar da praça, eles não comem sem tomar banho. E seguem muitos outros costumes que receberam por tradição: a maneira certa de lavar copos, jarras e vasilhas de cobre” (Mc 7, 3-4).
Como percebem que Jesus não se importa com semelhantes bobagens, perguntam-lhe quase furiosos: “Por que teus discípulos comem com as mãos imundas, sem se importarem com a tradição dos antigos?”.
A resposta de Jesus vai ser contundente: “E por que vós, por conservar esses costumes dos homens, deixais passar despercebido o mandato de Deus? Sois um povo que honra Deus com os lábios, mas tendes o coração bem longe d’Ele”.
Jesus não quer continuar discutindo; prefere voltar-se aos discípulos e às pessoas simples que o rodeiam, para ensinar-lhes uma verdade muito profunda.
“Vamos ver se todos me entendem bem! Nada do que entra no homem o torna mau, mas o que sai do homem é que o mancha e o torna mau de verdade. Porque, vejamos: onde nascem as coisas ruins que os homens fazem? Nascem dentro ou fora do homem? Não é verdade que saem de dentro? Porque de dentro, ou seja, do coração, saem todas as más intenções: as fornicações, os roubos, os homicídios, os adultérios, a avareza, a maldade, o engano, a desonestidade, a inveja, a calúnia, a soberba. De onde saem todas estas ações, se não é do coração? Todos estes atos maus – e não o fato de comer sem lavar as mãos – são os que mancham de verdade uma pessoa!…”
Jesus não tinha estudado psicologia em nenhuma universidade. Mas Ele, o formador do coração do homem e observador muito atento sempre, ganhava de qualquer professor de psicologia…
Efetivamente, podemos considerar cada ação que fazemos como uma criatura que nasce de nós. Nós a concebemos em nossa mente e gestamos em nosso coração. Pensamos nela mil vezes antes de levá-la à prática. Analisamos os prós e contras. Realizá-la é como dar à luz. Nasce a criatura que concebemos voluntariamente.
Então, entra em jogo a sinceridade conosco mesmos: uma ação boa? Teve uma gestação muito feliz dentro da nossa cabeça e do nosso coração. Uma ação ruim? Teve, infelizmente também, uma gestação muito longa. Por isso mesmo, somos responsáveis por nossas ações, tanto pelas boas quanto pelas ruins…
É muito certo aquele princípio de psicologia e de moral aplicado aos males que uma pessoa comete e dos quais Jesus nos fala neste evangelho tão grave: “Ninguém se torna mau de repente. Aqueles que caem em coisas muito graves começam por coisas muito pequenas”.
Por onde se começa? Normalmente, por um simples pensamento: “Eu me daria bem se fizesse isso…!”. Já está dentro a semente do mal. Depois, chega o momento de pensar mil vezes naquilo e alegrar-nos com isso: “E se eu fizesse mesmo?”. Finalmente, chega a hora de realizá-lo: “E por que não? Então, claro que sim!”. Este é o processo do qual Jesus nos fala hoje: de dentro, de dentro é que vem todo o mal!…
Pois bem, se queremos evitar o mal ou retificá-lo depois de cometer a burrada, virá o momento de voltar à razão e, sobretudo, ao próprio Jesus Cristo.
Primeiramente à razão. E aqui vale a pena lembrar os versos do poeta latino: “Longe com os princípios! A medicina chega tarde, quando os males cresceram muito pelo atraso do remédio…”. É preciso frear o quanto antes o caminho do pensamento e do desejo.
Se olharmos para Jesus Cristo, quem nos vem à memória é São Paulo: “Tende em vós os mesmos sentimentos do Senhor Jesus”. Hoje, gostaríamos de traduzir este desejo do Apóstolo com uma expressão como esta: um “transplante de coração”! Que desapareça de nosso peito esse nosso coração tão cheio de imperfeições; que o substituamos pelo coração do próprio Cristo. Este sim que seria o remédio dos remédios…
Senhor Jesus Cristo! O mundo padece de muitos males, é verdade, e vós diagnosticais acertadamente sua origem mais profunda. Por que não transformais nosso coração? Por que os que são vossos – nós, pelo menos – não pensamos como vós, não somos puros, bondosos e generosos como vós, para não realizar mais que obras boas que curariam o mundo?… Jesus Cristo, cirurgião divino, transformai nosso coração!
Fonte: Zenit 28/08/2009