Caros Sacerdotes,
Na próxima solenidade do Sagrado Coração de Jesus (que acontece no dia 15 de junho de 2012, celebraremos, como de costume, o “Dia Mundial de Oração pela Santificação do Clero”.
A afirmação da Escritura “Esta é a vontade de Deus : a vossa santificação!”, mesmo sendo dirigida a todos os cristãos, refere-se de modo particular a nós, sacerdotes que acolhemos não só o convite a “santificar-nos”, mas também aquele a tornar-nos “ministros da santificação” para os nossos irmãos.
Esta “vontade de Deus”, no nosso caso, se é, pode-se dizer, redobrada e multiplicada ao infinito, tanto que a ela devemos obedecer em cada ação ação ministerial que desempenhamos.
É este o nosso estupendo destino: não podemos santificar-nos sem trabalhar pela santidade dos nossos irmãos, e não podemos trabalhar pela santidade dos nossos irmãos sem que tenhamos primeiro trabalhado e trabalhamos pela nossa santidade.
Introduzindo a Igreja no novo milênio, o Beato João Paulo II nos recordava a normalidade deste “ideal de perfeição”, que deve ser oferecido logo a todos:” Perguntar a um catecúmeno: “Queres receber o Batismo?” significa ao mesmo tempo perguntar-lhe: “Queres tornar-te santo?” (1).
Certamente no dia da nossa ordenação sacerdotal, esta mesma pergunta batismal ressoou novamente no nosso coração, pedindo, então, nossa pessoal resposta; mãs ela nos foi confiada porque frequentemente dirigimo-la os nossos fiéis, zelando pela sua beleza e preciosidade.
Esta persuasão não é contradita pela consciência das nossas pessoais infidelidades, e muito menos pelas culpas de alguns que, às vezes, tem humilhado o sacerdócio aos olhos do mundo.
À distância de dez anos – considerando os ulteriores agravamentos das notícias difundidas – devemos fazer ressoar de novo no nosso coração, com mais força e urgência, as palavras que João Paulo II nos dirigiu na Quinta-Feira santa do ano de 2002:
"Neste momento, no entanto, como sacerdotes, somos pessoalmente atingidos profundamente pelos pecados de alguns dos nossos irmãos que traíram a graça recebida com a Ordenação, cedendo também às piores manifestações do mysterium iniquitatis que age no mundo. Surgem, assim, escândalos graves, com a consequência de atirar uma pesada sombra de suspeita aos outros beneméritos sacerdotes, que desenvolvem o seu ministério com honestidade e coerência, até com heroica caridade. Enquanto a Igreja expressa a própria solicitude pelas vítimas e se esforça para responder segundo a verdade e a justiça a cada penosa situação, nós todos, conscientes da humana fraqueza, mas confiando na potência sanadora da graça divina – somos chamados a abraçar o “mysterium crucis” e a empenhar-nos em seguida na procura da santidade. Devemos rezar para que Deus, na sua providência, suscite nos corações um generoso reavivamento daqueles ideais de total doação a Cristo que estão na base do ministério sacerdotal”. (2)
Como ministros da misericórdia de Deus, nós sabemos, portanto, que a procura da santidade pode sempre recomeçar pelo arrependimento e pelo perdão. Mas sentimos também a necessidade de invoca-lo, cada um dos sacerdotes, em nome de todos os sacerdotes e por todos os sacerdotes (3).
A nossa confiança vem, pois, em seguida, reforçada pelo convite que própria Igreja nos dirige a atravessar a Porta fidei, acompanhando todos os nossos fiéis. Sabemos que este é o título da Carta Apostólica com a qual o Santo Padre Bento XVI instituiu o Ano da Fé, que terá início no próximo dia 12 de outubro de 2012. Uma reflexão sobre as circunstâncias deste convite nos pode ajudar.
Ele se coloca no quinquagésimo aniversário da abertura do Concilio Ecumênico Vaticano II (11 de outubro de 1962) e no vigésimo aniversário da publicação do Catecismo da Igreja Católica (11 de outubro de 1992). Além disso, para o mese de outubro de 2012, foi convocada a Assembléia Geral do Sinodo dos Bispos sobre o tema “A nova Evangelização para a transmissão da fé cristã”.
Nos será pedido, portanto, que trabalhemos em profundidade sobre cada um destes assuntos:
– sobre o Concilio Vaticano II, para que seja novamente acolhido como “a grande graça com a qual a Igreja se beneficiou no século XX”: “Uma segura bússola para orientar-nos no caminho do século que se abre”, “uma grande força para a sempre necessária renovação da Igreja” (4);
– sobre o Catecismo da Igreja Catecismo da Igreja Católica, para que seja verdadeiramente acolhido e utilizado “como um instrumento válido e legítimo a serviço da comunhão eclesial e como uma norma segura para o ensinamento da fé” (5) ;
– sobre a preparação do próximo Sínodo dos Bispos para que seja, de fato, “uma ocasião propícia para introduzir o inteiro projeto eclesial em um tempo de particular reflexão e redescoberta da fé” (6).
Por enquanto – como introdução a todo o trabalho – podemos brevemente meditar sobre esta indicação do Pontífice, para a qual tudo converge:
“É o amor de Cristo que plenifica os nossos corações e nos impulsiona a evangelizar e Ele, hoje, como então, nos envia pelas estradas do mundo para proclamar o seu Evangelho a todos os povos da terra (cf Mt 28,19). Com o seu amor, Jesus Cristo atrai a si os homens de cada geração: em cada tempo Ele convoca a Igreja, confiando-lhe o anúncio do Evangelho, com um mandato que é sempre novo. Por isso, hoje é necessário um mais convicto empenho eclesial a favor de uma nova evangelização para redescobrir a alegria de crer e encontrar o entusiasmo de comunicar a fé” (7).
“Todos os homens de cada geração”, “todos os povos da terra”, “nova evangelização”: diante deste horizonte assim universal, reconhecendo que o homem é “capaz” de Deus” (8); mas, ele o fez escolhendo – como sua primeira citação – este texto do Concilio Vaticano II:
“A razão mais alta (“eximia ratio”) da dignidade humana consiste no chamado do homem à comunhão com Deus. O Homem é convidado ao diálogo com Deus desde a sua origem: ele, de fato, não existe, se não porque criado por Deus, das entranhas do seu amor (“ex amore”), continua sendo mantido na existência sempre tirado do seio de tal amor (“ex amore”); e não vive plenamente segundo a verdade, se não reconhece livremente este amor e não se confia ao seu Criador. No entanto, muitos dos nossos contemporâneos não percebem absolutamente ou explicitamente rejeitam este íntimo e vital envolvimento com Deus” (“hanc intimam ac vitalem coniunctionem cum Deo”) (9).
Com esquecer que, com o texto apenas citado – exatamente na riqueza das formulações escolhidas – os Padres conciliares pretendiam dirigir-se diretamente aos ateus, afirmando a imensa dignidade da vocação, da qual se haviam distanciado mesmo enquanto homens? E o faziam com as mesmas palavras que servem para descrever a experiência cristã, ao máximo da sua intensidade mística!
Também a Carta Apóstólica Porta Fidei inicia afirmando que esta “introduz na vida de comunhão com Deus”, o que significa que ela nos permite mergulhar diretamente no mistério central da fé que devemos professar: “Professar a fé na Trindade – Pai, filho e Espírito Santo – equivale a crer em um só Deus que é Amor (ib. n. 1).
Tudo isso deve ressoar particularmente no nosso coração e na nossa inteligência, para tornar-nos conscientes de qual seja o drama mais grave dos nossos tempos.
As nações já cristianizadas não são mais tentadas a ceder a um genérico ateísmo (como no passado), correm o risco de serem vítimas daquele particular ateísmo que vem de ter esquecido a beleza e o calor da Revelação Trinitária. Hoje são sobretudo os sacerdotes, na sua quotidiana adoração e no seu quotidiano ministério que devem reconduzir tudo à Comunhão Trinitária: só a partir dela e mergulhando nela, os fiéis podem descobrir de fato o vulto do Filho de Deus e a sua atualidade, e podem de fato tocar os coração de cada homem e a pátria à qual todos são chamados. E só assim nós, sacerdotes, podemos oferecer de novo aos homens de hoje a dignidade de ser pessoa, o sentido das relações humanas e da vida social, e o destino da criação inteira.
“Crer em um só Deus que é Amor”: nenhuma nova evangelização será de fato possível se nós, cristãos, não estivermos em grau de surpreender e comover novamente o mundo com o anúncio da Natureza do Amor do Nosso Deus, nas Três Pessoas que a exprimem e que nos envolvem na sua própria vida.
O mundo de hoje, com as suas feridas sempre mais dolorosas e preocupantes, tem necessidade do Deus-Trindade,e anuncia-lo é a tarefa da Igreja.
A Igreja, por poder cumprir esta tarefa, deve permanecer indissoluvelmente abraçada a Cristo e não deixar-se jamais separar: tem necessidade de santos que habitem “no Coração de Jesus” e sejam testemunhas felizes do Amor Trinitário de Deus.
E os sacerdotes, para servir a Igreja e o Mundo, tem necessidade de serem Santos!
Do Vaticano, 26 março 2012
Solenidade da Anunciação da Bem Aventurada Virgem Maria
Mauro Card. Piacenza
Prefeito
+ Celso Morga Iruzubieta
Arciebispo titular de Alba Marittima
Secretario
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1 Carta Apostólica Novo millennio ineunte, n. 31.
2 JOÃO PAULO II, Carta aos sacerdotes para a quinta-feira santa do ano de 2002.
3 CONGREGAÇÃO PARA O CLERO, o sacerdote ministro da Misericordia Divina. Subsidio para os Diretores Espirituais, 9 março de 2011, 14-18; 74-76; 110-116 (sacerdote como penitente e discípulo espiritual).
4 Cfr. Porta fidei, n.5.
5 Cfr. Ibid, n. 11.
6 Ibid, n. 5.
7 Ibid, n. 7.
8 Primeira Sessão. Capitulo I.
9 Gaudium et Spes, n. 19 e Catecismo da Igreja.