4º PASSO DA SOBRIEDADE: ARREPENDER-SE – Fizemos a opção errada, pensando ser a certa. E agora? Se a esperança é última que morre, Deus vai além dela.
Palavra: Lc 15,11ss:
11. “Jesus continuou: ‘Um homem tinha dois filhos.
12. O filho mais novo disse ao pai: – Pai, me dá a parte da herança que me cabe. E o pai dividiu os bens entre eles.
13. Poucos dias depois, o filho mais novo juntou o que era seu, e partiu para um lugar distante. E aí esbanjou tudo numa vida desenfreada.
14. Quando tinha gasto tudo o que possuía, houve uma grande fome nesta região, e ele começou a passar necessidade.
15. Então foi pedir trabalho a um homem do lugar, que o mandou para a roça, cuidar dos porcos.
16. O rapaz queria matar a fome com a lavagem que os porcos comiam, mas nem isso lhe davam.
17. Então, caindo em si, disse: ‘Quantos empregados de meu pai têm pão com fartura, e eu aqui, morrendo de fome…
18. Vou me levantar, e vou encontrar meu pai, e dizer a ele: – Pai, pequei contra Deus e contra ti;
19. já não mereço que me chamem teu filho. Trata-me como um dos teus empregados’.
20. Então se levantou e foi ao encontro do pai.
A fundamentação da espiritualidade do Programa de Vida Nova está baseada nesta parábola. E iniciando hoje mais um passo da Caminhada, Deus nos chama a atenção para além da liberdade de escolha que temos, que é o arrependimento. Podemos escolher e podemos voltas atrás. Podemos fazer até a escolha errada, mas não devemos permanecer no erro. Fazendo uma breve análise a respeito da parábola podemos fazer uma interpretação bem atual. Este jovem apresenta-se como alguém que tinha aí suas regalias. Provavelmente um quase adulto. Será que lhe faltava algo? Ele tem pensamentos arrogantes, pois se dirige ao pai e pede o que lhe é de direito, partilha dos bens que o pai construiu. Nós nos parecemos com este jovem quando apropriamo-nos das coisas de Deus e não cuidamos. Usufruímos dos privilégios da natureza e não zelamos, tomamos a terra como nossa e destruímos, desmatamos. Quer ver um exemplo mais próximo? Como estamos cuidando dos filhos que recebemos de Deus?
Voltando à parábola, o filho se afastou e desperdiçou tudo o que tinha. Não valorizou um centavo do esforço do pai. Ele não quis e não soube administrar a sua vida longe do pai. E vieram os tempos difíceis, e ele foi obrigado a trabalhar, com porcos, sem privilégios, o que para um judeu da época era de uma extrema humilhação. Quantas vezes rogamos a Deus para que nos dê frutos, para que olhe por nós e assim que alcançamos as graças não nos lembramos dos nossos esforços ou o quanto nos empenhamos para conseguir. Esquecemos de que tivemos a graça da saúde, do ânimo, da presença de espírito, da esperança alimentada diariamente. Na ingratidão automaticamente nos afastamos, desperdiçamos o bom senso, desvalorizamos a segurança, retaliamos a cautela e quando nos encontramos arrasados achamos que Deus não quer o nosso bem. Deus não é detentor das consequências. Quando fazemos opções, o pacote já vem incluindo as consequências.
Na parábola, o filho então se lembra da fartura da casa de seu pai, e reconhece o erro que cometeu. Enquanto esteve gastando ou quando exigiu seus bens não avaliou sobre a decisão que estava tomando, não sofreu pela ausência, pelo distanciamento do lar, não enquanto estava em esbórnia. Quem nunca viveu uma fase egoísta? Sabemos que voltamos ao Pai na maioria das vezes pela dor. Somos autossuficientes para experimentar as ofertas do mundo. Nem questionamos se vale mesmo à pena ou se vamos afetar os nossos relacionamentos. Argumentamos que temos que viver a nossa vida e que precisamos fazer experiências novas. E quanto mais olhamos para nossas satisfações, mais nos distanciamos do que é coerente. Fizemos a opção errada, pensando ser a certa. E agora?
Geralmente quando fracassamos em algo, temos muita pena de nós mesmos e lamentamos a Deus pelo nosso abandono. Abandonamos-nos, deixamo-nos à revelia, e os acontecimentos tomaram conta de nós. E aqui muito nos toca a questão da família. Ainda somos filhos do mesmo Pai, ainda temos a família, ainda temos a quem recorrer. Mas temos um muro muito grande que é o medo de ser negado. Tememos voltar atrás.
Tememos mudar a nossa atitude porque não sabemos se vamos ser aceitos em razão das ações anteriores. Tememos no fundo não ser amados.
Portanto, essa é a primeira atitude para recuarmos do projeto de morte: aceitar humildemente que agimos conforme pensamentos que se voltavam exclusivamente para nós. Agimos em nome de prazeres que nos preenchiam. Agimos ou deixamos de agir porque era mais cômodo, mais fácil. Agimos assim porque não amamos suficientemente as coisas que nos foram dadas, porque não aceitamos as condições que nos foram colocadas e quisemos dar o nosso jeito, e erramos feio. Reconhecer o erro significa admitir a nossa incapacidade diante do mundo. Tememos o mundo que gira em torno de nós. O mundo dos amigos, dos parentes, dos que nos aconselharam, dos que nos preveniram. É muito difícil baixar a cabeça. Às vezes o pescoço chega a se quebrar quando não cedemos e então recorremos emergencialmente a Deus ou vamos manter este pescoço quebrado, sem dignidade até resolvamos consertá-lo. Isso se chama cair em si. Se a esperança é última que morre, Deus vai além dela.
Em nosso arrependimento Ele se alegra e nos dá as melhores vestes, nos acalenta, nos conforma, nos conforta e acolhe a nossa dor, a dor de quem se submeteu a dizer que falhou, que está cansado e que precisa de repouso. A vergonha é um mal necessário, afinal depois do que fizemos, temos mesmo que lamentar por tamanha falha. Em nenhuma circunstância devemos comparar os nossos erros com os dos outros. Este é um erro ainda maior. Tomando tal atitude, estaremos fazendo julgamentos que não nos cabem. Apenas aos outros cabe a avaliação de seus erros. Devemos avaliar apenas as nossas atitudes, verificando se está conivente com o que Jesus pregou para a humanidade.
Escolhemos nossa condenação e Deus as aceita. Vamos sentindo a Sua decepção através da nossa própria decepção, assim como sentimos a Sua alegria no retorno. Ele nos vê de longe e em profundidade, com ternura e benevolência. O que para nós é quase o fim do mundo, Deus chama de recomeço. Quando somos invadidos pela frustração, Deus encontra a nossa luz no fim do túnel. Todavia, assim como o filho pródigo, precisaremos encontrar o caminho de volta à casa do Pai.
Malena Ancrade – Psicóloga assessora da Pastoral da Sobriedade da Diocese de Blumenau