(CELEBRAR – 11º Passo da Sobriedade)
A ceia pascal de Jesus substitui os antigos sacrifícios e torna-se o centro vital da comunidade, formada pelos que seguem a Jesus. Seus gestos e Suas palavras não são apenas afirmação da Sua presença sacramental no pão e no vinho. Elas manifestam também o sentido profundo de Sua vida e morte, isto é, Jesus viveu e morreu como dom gratuito, como entrega de si mesmo aos outros, opondo-se a uma sociedade em que as pessoas vivem para si mesmas e para os seus próprios interesses. Na ausência de Jesus, os discípulos, seus seguidores, são convidados a fazer o mesmo: partilhar o pão com os pobres e viver para os outros.
Temos aí o privilégio de vivenciar pela consagração da eucaristia o momento mais sublime entre Jesus e seus seguidores. Somos seus seguidores. Este também é um momento sublime para nós, que somos convidados a participar da comunhão. Ele está vivo em nós e se faz presente na comunidade. É na comunhão que nos tornamos um só corpo e um só espírito. Nesses encontros semanais nos retroalimentamos dessa presença Divina, em que, assim como o pão e o vinho são consagrados em corpo e sangue, nós, por meio dessa participação na ceia, passamos a ser instrumentos de Seu amor.
É como se o templo fosse uma grande colméia, onde nos reunimos, entregamos o nosso sacrifício, as nossas alegrias, o nosso sofrimento, oferecemos o nosso talento, nos preenchemos da Sua graça e saímos por outros campos, polinizando o amor, a caridade, combatendo o mal, cuidando com zelo do próximo e aproximando-o da nossa colméia através da conversão.
Embora pareça que a última ceia nos traz um sentido de despedida, é a partir dela que renovamos a nossa espiritualidade. É por meio da comunhão que transformamos em permanente o exercício do bem maior. Estamos fadados a nos desgastar com os enfrentamentos do dia-a-dia, com os relacionamentos consumidos pelo desequilíbrio emocional, com a pressão no meio profissional, com a necessidade crescente de sempre ter algo que ainda não temos. Com os vícios que terminamos nos deixando cair para suportar esse sofrer.
Vivemos prestes a ter um colapso pelas irritações corriqueiras, que por situações insignificantes o nosso copo transborda, a nossa alma definha. Não temos condições de arcar com tudo isso sozinhos. Cada vez que tentamos crescer de modo que as pessoas percebam, menor nos tornamos, pois na verdade vai crescendo um rei em nossa barriga e não temos mais nem tempo nem espaço para perceber as necessidades do outro. Mais ainda, não percebemos que produzimos sofrimento no outro. Tornamo-nos cegos de coração. A nossa alma resseca.
Portanto, a participação na ceia é um convite a nossa regeneração. E esse convite também não é apenas para nos alimentarmos do corpo e do sangue de Cristo e digerirmos sozinhos. Essa presença de Cristo vivo em nós precisa emanar, precisa fluir, e pela conversão, alcançar e iluminar o caminho daqueles que buscam a paz e não conseguem encontrar, ou muitas vezes não sabem nem o que procuram, mas já sentem a necessidade de transformação. Dessa forma, podemos compreender o termo celebrar como a partilha de algo que nos toca e nos torna diferente do que éramos porque disso fazemos parte.
A leitura de Marcos 14, 22-25, comenta que Jesus tomou o pão e agradeceu e esse movimento nos relembra que temos a obrigação de agradecer pelo alimento, mas quantas vezes agradecemos por termos comida à mesa? Quantas vezes agradecemos por termos um corpo saudável porque temos o alimento que o mantém assim? Quantas vezes agradecemos por aqueles que de alguma forma tocaram naquele alimento desde a sua plantação e colheita, desde aquele que realizou o frete e aquele que carregou aos supermercados, até aquele que distribuiu em pacotes, que arrumou na prateleira e aquele que empacotou para nós? De que maneira agradecemos o alimento do corpo? Será que nesse momento passa pela nossa cabeça sobre aqueles que nada tem para se alimentar e que nós estamos sendo agraciados em saúde para trabalharmos e adquirirmos esse alimento?
Esse é o momento certo para pensarmos e não só agradecemos, mas também pedirmos por todos aqueles que participaram desse processo, afinal sem a sua participação indireta em nossa vida, não conseguiríamos ter essa diversidade de alimentos, principalmente os que passam pela industrialização, o qual requer um número de pessoas ainda maior. E assim como esse alimento se transforma em energia para que nós possamos realizar as nossas atividades diárias, o corpo e sangue de Cristo nos restabelece o espírito e nos recicla mais uma vez para que possamos por mais uma semana, nos comprometer com alegria e devoção diante das tarefas e dos enfrentamentos que nos são postos.
A leitura diz que o sangue é derramado em favor de muitos e isso significa dizer que essa prática deve alcançar muitas pessoas, ou seja, muitos devem ser favorecidos pelas ações de acolhimento, pelas palavras de esperança, pelo tempo que devotamos no trabalho gratuito em razão da necessidade de alguém, pelo sacrifício do tempo destinado a essas ações, pela compreensão sem repreensão do tratamento do vício, pela participação das atividades na comunidade, pelo envolvimento dentro das pastorais. Em cada opção dessas que a gente faça, estaremos dimensionando esse amor gratuito, incondicional, estaremos agindo em favor de muitos. É importante lembrar que o sacrifício de Jesus foi muito maior.
Tem uma estória que diz que numa certa cidade, uma bela catedral estava sendo construída. Ela era inteiramente feita de pedras, e centenas de operários moviam-se por todos os lados para levantá-la. Um dia, um visitante ilustre passou para visitar a grande construção. O visitante observou como aqueles trabalhadores passavam, um após o outro, carregando pesadas pedras, e resolveu entrevistar três deles. A pergunta foi a mesma para todos. O que você está fazendo? Carregando pedras, disse o primeiro; defendendo o meu pão, disse o segundo, mas o terceiro respondeu que estava construindo uma catedral, onde muitos iriam louvar a Deus, e onde seus filhos conheceriam o caminho do céu.
Essa história relata que apesar de todos estarem realizando a mesma tarefa, a maneira de cada um realizar é diferente. Assim igualmente acontece com a Missa. Ela é a mesma para todos, contudo a maneira de participar é diferente, dependendo da fé e do interesse de cada um. Existem os que vão para cumprir um preceito, há aqueles que vão para fazer seus pedidos e orações e há ainda aqueles que vão para louvar a Deus e em comunhão com os irmão se encher de força e graça para enfrentar os desafios que a vida lhe coloca, além de se colocar como instrumento do Seu amor. E nós, somos apenas mais um tijolo dessa grande igreja ou somos o templo vivo do Senhor?