Às vezes queremos mudar o mundo, mas na verdade, é da nossa mudança que o mundo precisa. (ORAR E VIGIAR – 9º PASSO DA SOBRIEDADE)
Este novo passo nos convida a exercer duas ações simultâneas: ORAR E VIGIAR, as quais não quer dizer a mesma coisa. A ORAÇÃO trata de conciliarmo-nos com o Criador. Desde que começamos essa nossa caminhada de Sobriedade, sempre estivemos falando de oração, do sentido da oração, da necessidade e do conforto da oração. Mas hoje esta palavra mostra-se com uma significação ainda maior. A oração mencionada neste trecho da Epístola de São Pedro (1Pd 4,7-11) nos convida principalmente à ação. Estamos caminhando para um fim, para uma finalidade, sejamos, portanto, moderados, sóbrios para dedicarmo-nos à oração. Esse encontro com Deus requer preparação, atitude, coerência e firmeza. Para orar precisamos ter um propósito. E que propósito é esse que nos leva à oração?
Esse propósito vai nos alimentar, vai encher e vai esvaziar para tornar a encher de novo assim sucessivamente. A engrenagem da nossa oração é o amor. O amor fraterno, o amor gratuito, o amor que ama e perdoa, que cede e que cobra, o amor que aceita e que converte. “O amor cobre multidão de pecados.” São Pedro nos instrui a praticar a acolhida entre nós, a aceitar as condições daqueles que ainda não estão convertidos e tentar seduzi-los através do nosso próprio exemplo. Às vezes queremos mudar o mundo e nos frustramos, pois somos incompreendidos, parece até que estamos na torre de Babel. Na verdade, é da nossa mudança que o mundo precisa. Devemos começar pelo nosso mundinho, pequeno, mesquinho, mentiroso, egoísta, manipulador, egocêntrico, preconceituoso, julgador. E por aí vai.
E cada um pode até se perguntar: Tá, mas Deus vai ouvir todo aquele que se colocar à sua frente. Desde o começo do nosso ciclo, onde vivemos os passos da Sobriedade falamos da oração no sentido da busca, da entrega, sempre se valendo da verdade, da necessidade da oração como suporte, facilitadora da nossa aproximação com o Senhor. Mas na medida em que nos colocamos cada vez mais próximos, através de sua luz, vamos enxergando melhor quem somos, onde erramos, e não temos mais como negar que precisamos mudar. Através da Sua face, Deus nos mostra que a nossa face, entendida aqui como a nossa vida, precisa de limpeza, precisa ser estimulada ao amor. E Ele está ali diante de nós, nas orações, nos conduzindo ao caminho da retidão. Por esta razão, a preparação é uma condição para viver uma oração verdadeira.
Assim o é quando vamos visitar alguém. Quando estamos necessitados, recorremos em socorro sem pensar em nossas aparências, afinal estamos fragilizados e debilitados. Daí, quando estamos num estado onde a emergência já foi atendida, ao visitarmos essa pessoa que nos socorreu, procuramos demonstrar que estamos em melhores condições, procuramos cuidar da aparência, da beleza. Se tivermos um perfume colocamos para que ela perceba que já não somos com antes, maltrapilhos, flagelados, descuidados. E como em toda visita, levamos de costume um agrado, pedimos licença, agradecemos por tudo o quanto essa pessoa nos fez e nos desculpamos de algum contratempo.
Deus quer primeiramente a beleza da alma. Se algum dia nos flagelamos pelos pecados, pelos erros, e pelos vícios, no momento da necessidade Ele nos socorreu. Agora, em melhores condições, preparemo-nos para ir ao seu encontro. Como estão nossas ações no dia-a-dia? Estamos sendo acolhedores no trabalho? Estamos aceitando as diferenças dentro da nossa própria casa? Estamos sendo reservado ao invés de inflamar discussões? Estamos dando mais bom dia? Estamos rezando com o filho pequeno ao pé da cama? Estamos convidando o esposo, a esposa a rezar junto? Estamos indo à casa de Deus?
Agora então podemos falar sobre VIGIAR. É aqui que entra essa outra ação. Com tudo o que nos cerca hoje, somos quase que coagidos a práticas que desagradam a Deus. Seja no trânsito, na tensão vivenciada no trabalho, nas horas do dia que parecem curtas quando se tem tanto a fazer, nas divergências de opiniões ou quando o outro não nos aceita como somos. Quando trabalhamos esse encontro com o Senhor, quando nos preparamos, quando nos prontificamos à oração, também criamos habilidade para percebermos essas situações impostas de fora. E nos damos conta que não somos nós que somos assim, que temos a possibilidade da escolha.
Podemos dizer não à grosseria com amor. Podemos agir diferente do agressor, negando o seu grito, com firmeza. Podemos aceitar que o outro nos ultrapasse no trânsito, pois quem sabe tem uma urgência maior que a nossa. Rezemos para que ele consiga chegar onde quer, vivo. No trabalho, façamos com dedicação, não pelo patrão, mas por nós, para que a nossa obra seja perfeita, assim como foi em nós a obra de Deus. Sejamos dignos. A Leitura fala: “Cada um viva de acordo com a graça recebida e coloquem-se a serviço dos outros, como bons administradores das muitas formas da graça que Deus concedeu a vocês.”
Só conseguiremos ser hábeis vigilantes, se formos atuantes em nossas orações, se tivermos zelo, se formos coerentes, se ouvirmos mais que falarmos, se admitirmos nossos erros e vícios, se confiarmos nossos pecados a Deus e entregarmo-nos de tal forma que Ele nos molde assim como o barro na mão do oleiro; se arrependidos, conseguirmos humildemente confessar os nossos pecados; e renascidos, de coração limpo, reparar os erros cometidos aos nossos semelhantes sem a pretensão de acusarmos quaisquer de suas falhas; se lembrarmos sempre da existência de Cristo em nossas vidas em nossas atitudes e em nossas orações, teremos então condições de nos livrarmos do mal.
Na construção da nossa história os homens já foram marcados como animais no período da escravidão. Nos dias atuais passamos por situações que parecem ter mudado apenas de dono, mas continuamos escravos, seja do consumismo desenfreado, seja da gula gerada pelas ansiedades do dia-a-dia, seja da luxúria em sua eterna sede de ostentação, seja da avareza que se volta somente para si, seja da preguiça apoiada nos vícios em substâncias químicas, seja pela falta de controle emocional e orientação espiritual. A moderação a qual Pedro nos coloca nesta leitura se reporta a uma mente limpa, pois a idéia do tempo de Deus está presente aqui e já acontece, e vivendo, nós experimentamos os seus efeitos. Portanto, a mensagem que ele traz é para prestarmos atenção ao tempo em que vivemos e que possamos perceber o acontece ao nosso redor para que possamos ter uma posição definida e que sejamos firmes em Deus, sem nos deixarmos perturbar, sem nos deixarmos levar por essa onda de destruição do corpo e do espírito, provocados pelo mal que tenta destroçar a afastar a criação do seu criador.