Intervenção na audiência geral desta quarta-feira, 15 de dezembro
Apresentamos, a seguir, a catequese dirigida pelo Papa aos grupos de peregrinos do mundo inteiro, reunidos na Sala Paulo VI para a audiência geral.
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Queridos irmãos e irmãs:
Hoje eu gostaria de apresentar uma mística que não é da época medieval: Santa Verônica Juliani, monja clarissa capuchinha. A razão é que no dia 27 de dezembro comemoraremos os 350 anos do seu nascimento. Città di Castello, onde viveu durante mais tempo e morreu, assim como Mercatello – sua cidade natal – e a diocese de Urbino, vivem com alegria este acontecimento.
Verônica nasceu precisamente em 27 de dezembro de 1660, em Mercatello, no vale do Metauro, de Francesco Giuliani e Benedetta Mancini; foi a última de sete irmãs, das quais três abraçaram a vida monástica. Ela recebeu o nome de Úrsula. Aos sete anos de idade, perdeu sua mãe, e seu pai mudou-se para Piacenza, como superintendente na sede do Ducado de Parma. Nessa cidade, Úrsula sentiu crescer dentro de si o desejo de dedicar sua vida a Cristo. O chamado foi cada vez mais premente, de modo que, aos 17 anos, entrou na clausura estrita do mosteiro das Clarissas Capuchinhas de Città di Castello, onde permaneceu durante toda a sua vida. Lá, recebeu o nome Verônica, que significa "verdadeira imagem" e, de fato, ela se tornaria uma verdadeira imagem de Cristo Crucificado. Um ano depois, emitiu a profissão religiosa solene: começou para ela o caminho de configuração com Cristo, através de muitas penitências, grandes sofrimentos e experiências místicas relacionadas à Paixão de Jesus – a coroação de espinhos, o esponsório místico, a ferida no coração e os estigmas. Em 1976, aos 56 anos, tornou-se abadessa do mosteiro e foi reconfirmada no cargo até sua morte, ocorrida em 1727, após uma dolorosa agonia de 33 dias que culminou com uma alegria profunda, tanto as suas últimas palavras foram: "Encontrei o Amor, o Amor deixou-se contemplar! Esta é a causa do meu padecimento. Contai a todas, contai a todas!" (Summarium Beatificationis, 115-120). Em 9 de julho, deixou a morada terrena para o encontro com Deus. Ela tinha 67 anos, cinquenta dos quais foram passados no mosteiro de Città di Castello. Foi proclamada santa em 26 de maio de 1839, pelo Papa Gregório XVI.
Verônica Juliani escreveu muito: cartas, relatos autobiográficos, poemas. A principal fonte para reconstruir o seu pensamento é, contudo, o seu "Diário", iniciado em 1693: são 22 mil páginas manuscritas, abrangendo um arco de 34 anos de vida monástica. A escrita flui espontânea e continuamente, sem rasuras ou correções, nem traços ou distribuição da matéria em capítulos ou partes, de acordo com uma estrutura pré-determinada. Verônica não pretendia compor uma obra literária; pelo contrário, foi forçada a escrever as suas experiências pelo Pe. Girolamo Bastianelli, religioso dos Filipinos, de acordo com o bispo diocesano Antonio Eustachi.
Santa Verônica tem uma espiritualidade fortemente cristológico-esponsal: é a experiência de ser amada por Cristo, Esposo fiel e sincero, e de querer corresponder com um amor cada vez mais envolvido e apaixonado. Nela, tudo é interpretado a partir do prisma do amor, e isso lhe infunde uma profunda serenidade. Tudo é vivido em união com Cristo, por amor a Ele e com alegria de poder demonstrar-lhe todo o amor de que uma criatura é capaz.
O Cristo a quem Verônica está profundamente unida é o sofredor da paixão, morte e ressurreição; é Jesus no ato de oferecer-se ao Pai para nos salvar. Também deriva dessa experiência o amor intenso e sofredor pela Igreja, sob as formas de oração e de oferecimento. A santa vive nesta perspectiva: rezar, sofrer, buscar a "santa pobreza", como "expropriação", perda de si mesma (cf. ibid., III, 523), precisamente para ser como Cristo, que se entregou de forma total.
Em cada página de seus escritos, Verônica coloca alguém nas mãos do Senhor, aumentando o valor da sua oração intercessora com o oferecimento de si mesma em cada sofrimento. Seu coração está aberto a todas "as necessidades da Santa Igreja", vivendo com anseio o desejo da salvação de "todo o universo" (ibid., III, IV, passim). Verônica grita: "Ó pecadores, ó, pecadoras… Todos e todas, vinde ao coração de Jesus, vinde lavar-vos em seu precioso sangue… Ele está vos esperando de braços abertos para abraçar-vos" (ibid., II, 16-17). Impulsionada por uma ardente caridade, dá às irmãs do mosteiro atenção, compreensão, perdão; oferece suas orações e sacrifícios pelo Papa, pelo seu bispo, pelos sacerdotes e por todos aqueles em necessidade, incluindo as almas do purgatório. Resume sua missão contemplativa com estas palavras: "Nós não podemos sair pregando pelo mundo para converter almas, mas estamos obrigadas a orar continuamente por todas aquelas almas que estão ofendendo a Deus… especialmente com os nossos sofrimentos, ou seja, com um princípio de vida crucificada" (ibid., IV, 877). Nossa santa encara esta missão como "estar no meio" entre os homens e Deus, entre os pecadores e Cristo Crucificado.
Verônica vive de maneira profunda a participação no amor sofredor de Jesus, certa de que "sofrer com alegria" é a "chave do amor" (cf. ibidem, I, 299.417; III, 330303871, IV, 192). Ela mostra que Jesus sofreu pelos pecados dos homens, mas também pelos sofrimentos que os seus servos fiéis teriam de ter suportado ao longo dos séculos, no tempo da Igreja, precisamente por sua fé sólida e coerente. Escreve: "Seu Pai eterno o fez ver e sentir naquele momento todos os padecimentos que deveriam ter os seus escolhidos, suas almas mais amadas, ou seja, aquelas que teriam aproveitado o seu sangue e todos os seus sofrimentos" (ibid., II, 170). Como diz de si mesmo o apóstolo Paulo, "Alegro-me nos sofrimentos que tenho suportado por vós e completo, na minha carne, o que falta às tribulações de Cristo em favor do seu Corpo que é a Igreja" (Col 1,24). Verônica chega a pedir a Jesus ser crucificada com Ele: "Em um instante – escreve – eu vi sair de suas feridas santíssimas cinco raios brilhantes; e todos vieram ao meu redor. E eu vi estes raios se transformarem como em pequenas chamas. Em quatro, estavam os pregos; e em uma estava a lança, como o ouro, toda de fogo: e me transpassou o coração, parte por parte… e os pregos atravessaram as mãos e os pés. Eu senti muita dor; mas na própria dor, eu me via, eu me sentia completamente transformada em Deus" (Diário, I, 897).
A santa está convencida de que participa agora do Reino de Deus, mas ao mesmo tempo invoca todos os santos da Pátria bem-aventurada, para que venham em seu auxílio, no caminho da sua doação, à espera da bem-aventurança eterna; esta é a aspiração constante da sua vida (cfr ibid., II, 909; V, 246). No que diz respeito à pregação da época, muitas vezes focada em "salvar a própria alma", em termos individuais, Verônica mostra um forte sentido de "solidariedade", de comunhão com todos os irmãos e irmãs no caminho rumo ao céu; e vive, reza, sofre por todos. As coisas penúltimas, terrenas, no entanto, ainda valorizadas no sentido franciscano como dons do Criador, são sempre relativas, totalmente subordinadas ao "gosto" de Deus e sob o sinal de uma pobreza radical. Na communio sanctorum, ela esclarece sua doação eclesial, bem como a relação entre a Igreja peregrina e a Igreja celeste. "Todos os santos – escreve – estão lá em cima por meio dos méritos e da paixão de Jesus; mas em tudo o que Nosso Senhor fez, eles colaboraram, de forma que sua vida esteve toda dirigida, regulada pelas (suas) próprias obras" (ibid., III, 203).
Nos escritos de Verônica, encontramos muitas citações bíblicas, às vezes indiretamente, mas sempre na hora certa: ela revela sua familiaridade com o texto sagrado, do qual se nutre sua experiência espiritual. Note-se, além disso, que os momentos fortes da experiência mística de Verônica nunca estão separados dos acontecimentos salvíficos celebrados na liturgia, onde têm um lugar especial a proclamação e a escuta da Palavra de Deus. A Escritura, portanto, ilumina, purifica, confirma a experiência de Verônica, tornando-a eclesial. Por outro lado, no entanto, precisamente sua experiência, enraizada na Sagrada Escritura com uma intensidade incomum, conduz a uma leitura mais profunda e "espiritual" do próprio texto, entra nas profundezas ocultas do texto. Ela não apenas se expressa com as palavras da Sagrada Escritura, mas realmente vive também dessas palavras, que se tornam vida nela.
Por exemplo, nossa santa muitas vezes citou as palavras do apóstolo Paulo: "Se Deus está conosco, quem será contra nós?" (Rm 8,31, cf. Diário, I, 714, II, 116,1021, III, 48). Nela, a assimilação deste texto paulino, essa grande confiança e profunda alegria sua, tornam-se mais um fato realizado em sua própria pessoa. "A minha alma – escreve – foi associada à vontade divina e eu me estabeleci verdadeiramente e permaneço para sempre na vontade de Deus. Parecia-me nunca ter de separar-me dessa vontade de Deus e voltei para mim com estas mesmas palavras: nada poderá me separar da vontade de Deus, nem as angústias, nem as penas, nem a dor, nem os desprezos, nem tentações, nem criaturas, nem demônios, nem a escuridão, e nem sequer a própria morte, porque, na vida e morte, quero tudo, e em tudo, a vontade de Deus" (Diário, IV, 272). Por isso, estamos também convencidos de que a morte não é a última palavra, estamos fixados na vontade de Deus e, assim, realmente, na vida para sempre.
Verônica se revela, em particular, como uma corajosa testemunha da beleza e do poder do amor divino, que a atrai, impregna, inflama. É o Amor crucificado que foi impresso na sua carne, como na de São Francisco de Assis, com os estigmas de Jesus. "Minha esposa – sussurra-me o Cristo crucificado -, são queridas para mim as penitência que fazes por aqueles que são a minha desgraça… Depois, tirando um braço da cruz, fez-me um sinal para que eu me aproximasse do seu lado transpassado… E me encontrei nos braços do Crucificado. O que senti naquele momento eu não consigo dizer: eu poderia estar sempre em seu santo lado" (ibid., I, 37). É também uma imagem de sua jornada espiritual, sua vida interior: estar no abraço do Crucificado e, assim, estar no amor de Cristo pelos demais. Também com a Virgem Maria, Verônica vive um relacionamento de profunda intimidade, como testemunham as palavras que um dia a Senhora lhe disse e que recolhe em seu Diário: "Eu te fiz repousar no meu colo, foste unida à minha alma e foste levada por ela como em um voo até de Deus" (IV, 901).
Santa Verônica Juliani convida-nos a crescer em nossa vida cristã, na união com o Senhor, no viver para os demais, abandonando-nos à sua vontade com confiança total e completa, e na união com a Igreja, a Esposa de Cristo; convida-nos a participar do amor sofredor de Jesus Crucificado para a salvação de todos os pecadores; convida-nos a ter o olhar fixo no Paraíso, meta da nossa jornada terrena, onde viveremos, junto a muitos irmãos e irmãs, a alegria da comunhão plena com Deus; convida-nos a alimentar-nos diariamente com a Palavra de Deus para acender nossos corações e guiar nossas vidas. As últimas palavras da santa podem ser consideradas um resumo de sua apaixonada experiência mística: "Encontrei o Amor, o Amor deixou-se contemplar!". Obrigado.
[No final da audiência, o Papa cumprimentou os peregrinos em vários idiomas. Em português, disse:]
Queridos irmãos e irmãs:
Completam-se nestes dias 350 anos do nascimento de Úrsula Juliani, que, aos 17, entrou no mosteiro das Clarissas Capuchinhas em Città di Castello. Aqui ficará toda a vida, tomando o nome de Verônica, pelo qual é conhecida: Santa Verônica Juliani. A fonte principal para conhecermos a sua espiritualidade é o Diário: sente-se amada por Cristo, Esposo fiel e sincero, e quer corresponder com todo o amor de que é capaz uma criatura. Revela-se uma testemunha corajosa da beleza e da força do Amor divino, que a atrai, invade e abrasa. É o Amor crucificado que se imprimiu na sua carne – como na de São Francisco de Assis – com os estigmas de Jesus. As últimas palavras de Verônica podem considerar-se a síntese da sua apaixonada experiência mística: "Encontrei o Amor, o Amor deixou-se contemplar!".
Amados peregrinos de língua portuguesa, a minha cordial saudação de boas-vindas para todos vós. Fortes na fé, possam os vossos corações estar sempre ao serviço dos irmãos, por amor de Deus. Sobre vós e vossas famílias, invoco abundantes bênçãos do céu, sendo a maior e o resumo de todas elas Jesus Cristo, Deus feito homem. A sua presença alegre a vossa vida, como sucedeu com a Virgem Mãe, que O concebeu por obra do Espírito Santo! Feliz Natal!
[Tradução: Aline Banchieri.
© Libreria Editrice Vaticana]