Reunidos neste desafio, estamos mais uma vez prontos a enfrentar as agruras do dia-a-dia. O ano recomeça, e com ele recomeçam os esforços e o empenho das nossas atividades. Estamos vivendo um tempo em que o país cresce economicamente e temos no mercado grande número de trabalho. É um tempo tranquilo na medida do possível, pelo menos no que toca a questão da subsistência. Já vivemos momentos históricos piores e por isso é importante valorizar o que temos agora.
Recebi uma mensagem que falava do nosso tempo e que faz muito sentido, que em uma hora ou outra passamos a nos sentir enquadrados. Esta mensagem diz que são construídos edifícios altos, mas os nossos temperamentos estão se reduzindo; se constroem estradas cada vez mais largas, mas os nossos pontos de vista estão cada vez mais estreitos; hoje gasta-se muito mais e tem-se muito menos; compra-se mais, mas desfruta-se menos; temos casas maiores para famílias menores; temos mais comodidades e menos tempo para aproveitar; adquire-se maior conhecimento e menor capacidade de discernir; temos medicina avançada e menos bem estar; desperdiça-se demais, se sorri menos; dirige-se rápido, e se irrita mais ainda; multiplicam-se as posses e reduzem-se os valores; fala-se muito, ouve-se pouco, ama-se menos ainda e enraivece-se frequentemente; aprende-se a ganhar a vida e não se vive; acrescentam-se anos à vida, mas não vida aos anos; fazem-se grandes coisas, mas não as melhores; se limpa o ambiente com os melhores desinfetantes e a alma continua contaminada; domina-se o átomo, mas não os preconceitos; escreve-se mais, aprende-se menos; planeja-se mais, realiza-se menos; temos casas mais luxuosas e mais lares desfeitos; os corpos passam a ser depósitos de excessos, comemos demais, fumamos demais, bebemos demais, ingerimos pílulas que fazem emagrecer, que fazem alegrar, fazem até morrer; temos comidas rápidas, viagens rápidas, fraldas descartáveis e corpos descartáveis; há janelas que se abrem para lugar nenhum. Esse paradoxo em que vivemos é uma representação daquilo que construímos e que optamos em viver.
Podemos agora, enxergando com os olhos do coração, vivenciar o passo reparar, consciente de que temos condições de fazer diferente. É exatamente o movimento contrário do que fazíamos que fará a diferença. Em alguns pontos o nosso conceito de certo mudará. Em alguns momentos seremos questionados e temos a obrigação de saber o que estamos fazendo, por que antes agíamos sem ter certeza, apenas para nos ver livres de situações que nos incomodavam, que nos constrangiam. Hoje, mais que a ação, devemos estar convictos do que fazemos porque optamos por refletir, por admitir, por enfrentar, por arrependermo-nos, por confessar e por reparar.
A verdade com nós mesmos nos projeta a uma conquista elevada de sentimentos e saberes, e vamos percebendo esses avanços ao nosso redor. Se nada mudou é porque nós não mudamos. Ou porque desejamos mudar e não aderimos o movimento de mudança na íntegra. Tenhamos isso em mente. O amadurecimento da razão e da emoção surge após a análise da nossa conduta, e, na maioria das vezes, os resultados não são os mais belos. Por esta razão, a análise é uma ação corajosa, de quem deseja o melhor para si e para os outros, mesmo que isso signifique redefinir-se diante do mundo.
O direito de errar é próprio de qualquer ser humano, mas o seu mantenimento eleva o erro a uma proporção tão grande que quase nos escapa a sua solução. Preparar-se para se recompor requer aceitar para si a dor que causamos. A dor da vergonha, da admissão, do remorso, da pequenez, a dor da massificação do ego, o medo das consequências, porque o extinto foi colocado num lugar que não lhe cabia, dando espaço ao egoísmo e à ignorância. O despertar causa dor e alívio, pois o arrependimento propõe a reparação. Todavia, o arrependimento não se completa por si só. Não há um sem a existência do outro.
Faz-se inadiável o compromisso de tomar para nós os prejuízos, de reparar as práticas danosas. O exercício da reparação nos encoraja a rever as inúmeras ações que praticamos e facilita a nossa reflexão. A reparação propicia dignidade a nós e a quem ofendemos, qualificando as relações na melhor das hipóteses e adequando outras que ainda não se sentem preparadas para perceber sobre a importância do perdão. O amor deve imperar mesmo que o coração do outro se mantenha magoado. O seu momento chegará mais cedo se a reparação for sensível ao mal alheio.
Devemos ter o hábito de renovarmo-nos no bem, de forma que não caiamos na tentação de ferir a sensibilidade dos outros, nem de nos agredirmo-nos com os vícios e práticas morais, que chegam a corroer o nosso íntimo. No entanto, se deixarmos o amor de lado, devemos retomar o mais urgente possível a nossa consciência e rever quais os caminhos que devem ser refeitos, e tentar aprender com os erros qual a parte que nos chama ao amadurecimento das nossas atitudes.
Malena Andrade – Psicóloga assessora da Pastoral de Sobriedade da Diocese de Blumenau