Estamos retomando a nossa caminhada e neste terceiro passo vamos dando segmento ao nosso novo projeto de vida, que começou com o nosso admitir. Foi preciso o esforço da busca, o reconhecimento de que certas coisas só acontecerão se nós acatarmos a idéia de que precisamos agir para que os fatos mudem. Ao mesmo tempo em que o Passo Admitir nos traz esperanças, ele também representa a nossa reconstrução, onde teremos que quebrar algumas paredes dentro de nós. E se a caminhada parece-nos lenta é porque certamente não nos deixamos abandonar nas mãos do Senhor quando vivenciamos o passo confiar na semana anterior.
O desafio da confiança vem nos lembrar que não somos uma fortaleza. Em algumas situações, acreditando que somos suficientes, precipitadamente agimos pelo impulso, pela emoção descontrolada, sem avaliar, até que deparamos com problemas que se tornaram ainda maiores, ou se não isso, tomaram uma vertente que sequer sabemos como enfrentar. O Passo Confiar nos mostra o caminho de volta ao Pai que nos aguarda, que nos envolve e que nos restabelece. E renovados pelas bênçãos somos inspirados pelo Seu amor. Este foi o primeiro momento para que parássemos e revigorássemos as nossas forças.
E confiantes chegamos aqui, para entregarmos exatamente o que somos e o que temos, desde o nosso maior segredo, até aquele olhar descuidado que estão cheios de valores, e vão perseguindo as ações das outras pessoas, que não nos competem. Devemos nos voltar para o nosso EU, voltar os olhos para a nossa pessoa e prestar mais atenção nas coisas que pensamos. Devemos mostrar a Deus quem somos na íntegra. Se temos defeitos, devemos entregar; se temos mágoas, devemos entregar; se temos aflição e angústia, devemos entregar; se temos medos, devemos entregar; se temos frustração, devemos entregar; se temos vazios, devemos entregar; se temos alegria, também devemos entregar e louvar por ela, pois esses momentos são preciosos e devem ser agradecidos.
Essa entrega nos aproxima ainda mais do nosso propósito de mudança. Na medida em que nos entregamos, tornamo-nos coniventes às coisas do Senhor. Se entregamos, é porque estamos sufocados e precisamos de apoio, de parceria. Se entregamos, dividimos aquilo que nos incomoda e logo somos preenchidos pelo conforto, pela consolação em Cristo. De alguma forma, vamos sentindo presente a essência do passo “admitir” e “confiar”, pois na entrega estamos reconhecendo as insatisfações que nos habitam, algumas por escolha, outras por imposição. De qualquer forma, é possível transformá-las. Mas essa transformação só acontecerá quando admitirmos que queremos essa mudança e acreditarmos que ela seja possível.
Penso nas provações que somos obrigados a enfrentar, e parece-me que é exigido de nós mais resistência do que acreditamos ter. O crucial é que junto com a ação diante de determinada dificuldade vem também o martírio, a dor. E essa dor se apresenta porque tememos enfrentar os desafios, porque tememos assumir o que precisamos enfrentar, porque precisaremos tomar atitudes contrárias àquelas que vínhamos tomando, porque será necessário um esforço maior, um empenho duradouro. E acreditem, em matéria de amor, somos tão preguiçosos…
O amor é um sentimento aprendido. É um valor que se exercita. Ninguém nasce amando, mas ao nascer pode sentir a presença do amor, mesmo sem saber que ele tem esse nome, a partir do momento em que as nossas primeiras necessidades são saciadas. Existe alguém que cuida de mim, me ama. Protege-me da fome, do frio, da sede, que me limpa quando faço sujeirinhas. O amor desse cuidador pode parecer incansável naquele momento. Na verdade não é que ela ou ele sejam super heróis, mas é que ao nascer frágeis e pequeninos nossos pais estão prontos para suportar esse cansaço.
Não somos provados além do que suportamos, basta que amemos. O que nos cabe compreender é que o amor não é uma palavra solta ao vento cheia de encanto, como se fosse um perfume que tocasse em cada pessoa por onde passasse e transformasse como num passe de mágica o feio em belo. Antes de tudo o amor exige renúncia, abrir um espaço dentro de nós, das nossas vontades e ceder esse espaço para as necessidades do outro. Outra situação que acontece é que essas necessidades parecem tão fáceis de resolver e não compreendemos porque é que esse outro precisa tanto roubar o nosso tempo e investimento se ele sozinho poderia dar conta.
Se colocar no lugar do outro com a visão que nós temos da vida é fácil. Agora, se a gente tira essa possibilidade, fica humanamente impossível, pois para sentir exatamente pelo que ele passa precisaríamos nascer ele. O máximo que podemos fazer é, nos esforçarmos por anular qualquer sentimento que se sobreponha ao julgo. E quando o amar estaciona apenas no sentimento, não atendendo a demanda da ação, então se chamará qualquer outra coisa, menos amor. Eis um bom exemplo de entrega. Quando nos entregamos não tem porque aguardar retorno. Estamos nos doando e dar não deve ter nada a ver com receber. Os dois têm significados completamente diferentes.
A relação que se instala entre o dar e o receber é um mecanismo de troca, de interesse. Tomando essa forma de pensamento, só damos quando queremos receber alguma coisa. Porém, o verdadeiro sentimento de amor é incondicional. Apenas se ama. E este é um lema que todos deveriam colocar como meta e vivenciar e se não sabe como fazer, aprende-se. Mas como aprender a amar? É simples. NÃO. Não é simples.
Puxa, mas eu tenho que anular os meus sentimentos, tenho que doar o meu tempo, tenho que me esforçar onde o outro não se esforça, tenho que me incomodar e nem ser reconhecido… E quando eu estiver em sofrimento, e quando eu não estiver mais aguentando? Pergunta um ouvinte. Então entregue aquilo que você não suporta nas mãos de Deus. Aquilo que não sabemos como vai funcionar devemos entregar para que Cristo venha interceder por nós. Quem sabe o amor bate à nossa porta e eis que se aproxima a quem menos esperávamos e nos dá a mão e nos ajuda a caminhar.
Este é um processo que não conseguimos compreendê-lo na íntegra porque estamos atados à mediocridade das recompensas. O que importa é o que teremos de volta. Se o que oferecemos está direcionado ao retorno dos nossos interesses, então não estaremos dando aquilo que o outro precisa, mas estamos projetando movimentos que nos dêem garantias do nosso empenho. Essa não é uma mensagem tão fácil de assimilar e de acolher, mas garante uma boa reflexão.
Malena Andrade – Psicóloga assessora da Pastoral da Sobriedade da Diocese de Blumenau