Pe. Inácio José Schuster
A Igreja autoriza a cremação (no 2301 – Catecismo da Igreja Católica), desde que não seja para desafiar a fé e descrer da ressurreição.
Nossos cemitérios se parecem a grandes cidades com edifícios vazios. Por que a Igreja não se expressa com clareza sobre a cremação dos corpos? Suscita sentimentos anticristãos e prejudica as almas? Ou se tem medo de desmantelar aparatos econômicos consolidados?
A posição da Igreja é ratificada no Código de Direito Canônico que está em vigor desde 1983: a cremação não se proíbe, mas é preferível a sepultura. Olhemos o texto: “A Igreja aconselha vivamente que se conserve o piedoso costume de sepultar o cadáver dos defuntos; mesmo assim, não proíbe a cremação, a não ser que tenha sido escolhida por razões contrárias a doutrina cristã” (cânon 1176 § 3). No passado a cremação foi várias vezes rechaçada pela Igreja Católica, porque ia relacionada com a crença de que com a morte tudo termina no nada; e também porque era uma burla ao costume cristão da sepultura. Esta mentalidade mudou.
Os motivos da saúde pública
A Igreja reconhece que a cremação hoje “é com freqüência pedida, não por ódio contra a Igreja ou contra os costumes cristãos, senão somente por razões higiênicas, econômicas ou de outro gênero, de ordem pública ou privada” (Instrução da Congregação do Santo Ofício, 1963). Em outras palavras, se legitima a cremação porque contribui à higiene ou a saúde pública, e porque já resolve as crescentes necessidades de espaço nos cemitérios da cidade. Em tais situações, além de respeitar a opção pessoal, se pode considerar o pedido de cremação.
A cremação, mais além de algumas particulares motivações ideológicas, se pode conciliar perfeitamente com a fé cristã e com a piedade para com o corpo do defunto. “De fato a cremação do cadáver, como não toca a alma não impede a onipotência divina reconstruir o corpo; assim não contém, em si e por si, a objetiva negação destes dogmas”, da ressurreição dos mortos e da imortalidade da alma.
O sentido pascal (morte e ressurreição) da cremação é o mesmo daquele da sepultura (inumação e tumulação): aquilo que volta a ser pó ou cinza está destinado à ressurreição. Por outro lado, ninguém pense que na ressurreição se retome a mesma matéria, o mesmo sistema ósseo que temos agora. Sabemos que nesta vida a matéria muda, mais ou menos, cada 7 anos. Em resumo, na ressurreição, não se tratará de um novo início da velha existência, senão de uma nova realidade de vida.
Espera da ressurreição
A Igreja não proíbe a cremação, mas recomenda continuar com “o piedoso costume de sepultar o cadáver dos defuntos”, porque tem um significado que, pelo contrário, não tem a cremação. Isto significa que, confiar o cadáver a terra é recordar a morte como um sono à espera do despertar na ressurreição.
Por isso o nome cristão de “cemitério” (que significa dormitório). Além do mais, na linguagem bíblica, a sepultura é também um sinal do limite humano: “Até que voltes a terra, pois dela foste tirado. Porque é pó e ao pó voltarás” (Gn 3, 19). Também: “Um penoso jugo foi imposto a todos os homens, uma pesada carga incomoda aos filhos de Adão, desde o dia em que saem do seio materno até aquele em que voltem a mãe terra” (Si 40, 1). Resumindo, sem recorrer a interpretações literais dos textos sagrados, as palavras bíblicas se ajeitam melhor a sepultura que a cremação.
A sensibilidade dos crentes
Mas nos perguntamos: Por que esperar a decomposição do cadáver quando se pode fazê-lo imediatamente com a cremação? A sepultura não deve ser considerada talvez como o resíduo de uma mentalidade atrasada e supersticiosa? Pensar as coisas dessa maneira significa dar a cremação um significado ideológico, seguramente diverso daquele anticristianismo e anti-religioso do passado, mas de todas as maneiras desaprovável. A sepultura expressa uma opção pelo desenvolvimento natural da decomposição, mas não é justo qualificá-la como naturalística ou irracional. Trata-se, pelo contrário, de uma sensibilidade que tem seu próprio significado e, para o crente, de um costume que se relaciona com uma longa tradição que também hoje encontra sentido.
As resistências psicológicas das pessoas a cremação – é escolhida por uma minoria – não se podem considerar como retardos culturais sobre a modernidade.
Deve-se, portanto, respeitar a quem pede a cremação, mas se deve dar uma informação adequada ao respeito ou responder a pressões que estejam nessa direção. Cálculos de mercado e de ganhos podem estar por debaixo das cerimônias de sepultura dos defuntos, mas isto pode suceder também para a cremação, e é necessário denunciar a ambos.
A piedade cristã exige que tanto na cremação como na sepultura sejam respeitadas as almas dos defuntos e os ritos sejam abertos a esperança (certeza) da ressurreição.
Morte – É verdade que a Igreja Católica não aprova a cremação?
A Igreja não proíbe a cremação, mas sugere que o corpo seja sepultado. Não é pecado ser cremado.
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA
O respeito aos mortos
2299. Aos moribundos devem ser prestadas todas as atenções necessárias para ajudar-lhes a viver seus últimos momentos na dignidade e na paz. Devem ser ajudados pela oração de seus parentes, os quais cuidarão que os enfermos recebam a tempo os sacramentos que preparam para o encontro com o Deus vivo.
2300. Os corpos dos defuntos devem ser tratados com respeito e caridade na fé e na esperança da ressurreição. Enterrar aos mortos é uma obra de misericórdia corporal, que honra aos filhos de Deus, templos do Espírito Santo.
2301. A autópsia dos cadáveres é moralmente admissível quando há razões de ordem legal ou de investigação científica. O dom gratuito de órgãos depois da morte é legítimo e pode ser meritório.
A Igreja permite a incineração quando com ela não se questiona a fé na ressurreição do corpo.
PORQUE A IGREJA RECOMENDA VIVAMENTE O ENTERRO DOS MORTOS E NÃO A CREMAÇÃO?
O cânon 1176 § 3 afirma que a Igreja aconselha vivamente que se conserve o piedoso costume de sepultar o cadáver dos finados, sem no entanto proibir a cremação, a não ser que tenha sido escolhida por razões contrárias a doutrina cristã.
Sem dúvida, como ensina a Instrução da Sagrada Congregação do Santo Ofício, Piam et constantem do 08/5/1963, a tradição de sepultar os mortos expressa melhor a fé na ressurreição e honra devida ao corpo.
Trata-se também de uma tradição comum ao judaísmo, que obedece ao texto bíblico de voltar como pó à própria terra. A cultura indoeuropéia associou em várias religiões a cremação a crença panteísta, e foi costume de militantes anticlericais a cremação para debochar e ridicularizar a verdade cristã da ressurreição.
Este contexto levou a colocar a cláusula impeditiva da cremação no cânon 1176, de proibi-la em caso de motivos contrários à fé cristã. Também o Ordo Exequiarum do 15/8/1969, desaprova que o cadáver seja acompanhado com cerimônias ao lugar da cremação, e dispõe que os ritos de encomendação possam fazer-se no mesmo edifício da cremação, ou se não há outro lugar, na mesma sala crematória, contanto que se evite o perigo de escândalo ou o indiferentismo religioso.
Como vemos, ainda que a cremação não seja um ato intrinsecamente mau, ela pode estar impregnada de uma falta de visão de fé na ressurreição da carne, especialmente hoje, que com a new age, voltou a estar em alta a doutrina da reencarnação, que colide frontalmente com a doutrina de Jesus Cristo.
O que são as catacumbas?
As catacumbas são antigos cemitérios subterrâneos, usados por algum tempo pelas comunidades cristãs e judaicas, sobretudo em Roma. As catacumbas cristãs, que são as mais numerosas, originaram-se no secundo século e a escavação continuou até à primeira metade do quinto século. Elas foram, na origem, apenas lugares de sepultura. Aqui os cristãos reuniam-se para celebrar os ritos fúnebres, os aniversários dos mártires e dos defuntos. Em casos excepcionais, durante as perseguições, serviram também como Lugar de refúgio momentâneo para a celebração da Eucaristia.
Elas nunca Foram usadas como esconderijos secretos dos cristãos, sendo isso pura lenda, ficção, proposta por romances e filmes. Acabadas as perseguições, sobretudo no tempo do papa São Dâmaso (366-384), as catacumbas tornaram-se verdadeiros e próprios santuários dos mártires, centros de devoção e de peregrinação de cristãos de todas as partes do império romano. Também existiam em Roma, naquela época, cemitérios ao aberto, mas os cristãos, por diversos motivos, preferiram os cemitérios subterrâneos. Antes de tudo eles recusavam o uso pagão da cremação dos corpos.
A exemplo da sepultura de Cristo, eles preferiam a inumação, por um senso de respeito para com o corpo destinado um dia à ressurreição dos mortos. Esse sentimento vivo dos cristãos criou um problema de espaço, que influiu fortemente no desenvolvimento das catacumbas. Caso tivessem utilizado apenas cemitérios ao aberto o espaço disponível deveria exaurir-se em pouco tempo, visto que normalmente os cristãos não reutilizavam os sepulcros.
As catacumbas resolveram o problema de forma econômica, prática e segura. Como os primeiros cristãos eram, em sua maioria, gente pobre, essa forma de sepultura foi decisiva. Existiram, entretanto, outros motivos que levaram à opção da escavação subterrânea. Era vivíssimo nos cristãos o sentido de comunidade: eles desejavam estar juntos também no “sono da morte”.
Além disso, esses lugares eram apartados permitindo, particularmente durante as perseguições, reuniões comunitárias reservadas e discretas e consentindo o livre uso dos símbolos cristãos. Em conformidade com a lei romana, que proibia a sepultura dos defuntos no recinto interno às muralhas da cidade, todas as catacumbas estão situadas ao longo das grandes estradas consulares e, geralmente, na imediata área suburbana daquele tempo.